Caminhões do exercito italiano carregando caixões de vitimas do coronavírus |
No meio de uma situação de tragédia, ninguém pensa em
dinheiro.
Estive em várias situações de desastre. Nestas situações, a
última coisa que você pensa é dinheiro. Pessoas estão morrendo, pessoas vão
morrer, pessoas estão em luto e em situação de estresse psicológico. Muitos
perderam tudo. E você ali, no meio daquilo tudo. Qual é a medida a tomar?
“Enterrar os mortos e cuidar dos vivos”, teria dito o
Marques de Pombal a um atônito Dom João, rei de Portugal, quando este lhe
perguntou o que fazer imediatamente após o Grande Terremoto de Lisboa, em 1755.
Hoje, com o mundo todo em meio a esta brutal pandemia
causada pelo coronavírus, esta é a questão: como enfrentar esta pandemia com o
menor número de mortos?
Entretanto, esta é uma crise sui generis. Estamos em
casa, e podemos assistir as notícias que vem de longe. Podemos ter acesso a
vídeos, lives e documentários. Podemos conversar com todos os nossos
parentes amigos e colegas pelo whatsapp. Não fosse a anormalidade, parece
que está tudo normal.
Mas não está. A falta de conhecimento das pessoas sobre o
que é um vírus acaba levando a inúmeras ações inseguras. Uma pessoa aqui
contamina a outra ali e a pandemia vai se espalhando a uma velocidade quase
supersônica.
Um vírus é muito pequeno, não conseguimos enxergá-lo. Parece
mesmo que não está ali. Por isso, para a maioria das pessoas, parece que a
pandemia não existe. O desfile de caixões nas ruas de Bergamo na Itália, não
comovem ninguém aqui, do outro lado do mundo, também com muitos problemas a
resolver.
Esta falta de empatia, no entanto, é também viral. Pessoas
enchem a boca pra subestimar “o tal do coronga”. É uma gripezinha, dizem
uns. É uma histeria, uma crise à toa, dizem outros.
Entretanto, as piores são as falas que fazem pouco caso da
tragédia, tendo com o contraponto as vidas das pessoas. “Morre um aqui,
outro ali pelas complicações, fazer o quê?”, disse em entrevista na semana
passada aquele que não mais nos governa.
Os empresários que estão apoiando a necropolítica da atual
gestão também se fazem ouvir em alto e bom som: Um empresário do entretenimento
faz coro ao necro-presidente, dizendo que "12 mil mortes em 7 bilhões
de habitantes é muito pouco pra criar essa histeria coletiva”.
A crise econômica que se avizinha por causa dos cuidados com
a pandemia também é criticada por estes empresários. Um empresário do ramo alimentício diz que “não podemos [parar a economia] por conta de 5 mil
pessoas que vão morrer”.
Por obvio que estas tantas mortes, na cabeça dos
empresários, não são de parentes seus, nem de entes queridos. São da “tigrada”.
São números num gráfico de barras do Excel. São corpos amontoados carregados
por carroças, como nas antigas ilustrações da Peste Negra, ou da procissão de
caminhões carregando caixões anônimos de vítimas anônimas vista pela televisão
ou na internet.
Quanto vale uma vida, uma só?
Essa é a questão que temos que resolver como sociedade.
Estamos com uma emergência muito grande, pois temos muitas pessoas vulneráveis,
que podem morrer pelo vírus. E temos muitas pessoas vulneráveis que podem
morrer de fome, pela asfixia econômica que o confinamento vai criar. O que
fazer?
Como disse ontem a economista Monica de Bolle, neste momento
eu não perguntaria isso para um economista, eu perguntaria primeiro para um
infectologista.
Existem diversas formas de fazer com que medidas de
prevenção contra o coronavirus e medidas de apoio social possam vigorar juntas
sem promover o caos. Tem muita gente pensando e propondo coisas interessantese factíveis. Existem governos executando políticas deste tipo.
Quanto vale vinte mil dólares no bolso dentro do Titanic
adernando? A economia não é tudo.
Vidas são mais.