sexta-feira, 20 de junho de 2014

UM PAÍS CHAMADO "BAXI"


Cartaz no metrô de Pequim, mostrando uma família  torcendo na Copa do Mundo, emulando uma torcida para o  "Baxi"(ou Brasil em mandarim); note-se a camisa verde-amarela da moça atrás do cara de vermelho...
Diversas vezes, enquanto estive lá, na China, as pessoas me perguntavam de onde eu era. Quando eu respondia – “Brazil” – invariavelmente escutava logo em seguida: “World Cup?” ou “football?”. No aeroporto, em ônibus e no metrô, em Pequim e nas outras cidades que visitei, eram comuns cartazes e outdoors falando algo do Brasil por conta do mundial.
Houve só uma pessoa que se mostrou bem informada sobre nós: um jovem, na Praça Tiananamen, corretamente se referiu ao Brasil e comentou e sobre os protestos contra a copa. Mas foi só. Exceção, o rapazinho de Tiananmen parecia alguém que já tinha viajado um pouco por aí. Os outros não demostravam o mesmo conhecimento. Um colega, geólogo do serviço geológico, chegou a me perguntar se o Brasil ficava na África. Outra pessoa, em outra circunstância, também me perguntou o mesmo.
O que eu entendi é que os chineses não dão muita atenção pra gente. Não o chinês médio, é claro. Afinal, a China é e sempre foi, para eles, o centro do mundo. Antigamente, referiam-se à China antiga como  o império do centro, ou o império do meio. O meio do mundo. O umbigo é muito forte na concepção chinesa do mundo. O que fica de nós pra eles é uma vaga lembrança de um país que gosta de jogar futebol e, além disso, o país que está sediando a copa do mundo. Isso somos nós, para eles.
O exotismo de um país distante, tropical, onde as pessoas gostam de jogar futebol parece ser a ideia que os chineses, e também o resto do mundo, acabam tendo de nós. Claro que encontrei Croatas que zombaram dizendo que iam ganhar da gente (sorry!), ou austríacos comentando sobre nossas possibilidades no mundial, ou ainda argentinos secando a gente. Tudo isso é o mundo. Vivíamos de TPM (tensão pré-mundial).
Hoje somos um país meio casmurro e muito mal humorado, em que boa parte (e parte pensante) rejeita a Copa do Mundo. Rejeitamos mesmo a Copa do Mundo? Sim, é um festival de breguices, de lugares comuns, de historias de boleiros que só fazem sentido dentro das quatro linhas. Sem falar, é claro, dos superfaturamentos, das obras de mobilidade inacabadas e outros quetais. O que se percebe é que, talvez, nosso mau humor com a copa seja fazer com que as pessoas lá na China entendam que nós somos muito  mais que uns idiotas alegres de um país tropical que sabem muito bem cobrar um escanteio (menos eu, perna-de-pau que sou!).
Essa contradição entre o que somo s e como somos vistos, acho eu, fazem parte de nosso momento. Acho que temos que relaxar um pouco dessa postura mal humorada e entender que somos na verdade um pouco isso e um pouco aquilo. Um pouco aquilo que projetamos ser – o tal país “padrão FIFA” que emergiu das jornadas de junho – e um pouco o país que nos enxergam, os de fora: a terra de boleiros que deixou de ser vira-latas há mais de cinquenta anos atrás, com Pelé e Mané.

A propósito: para os chineses, somos o “Baxi”, o tal país que é tão bom nesse negócio de colocar uma bola no gol que eles nos copiam e nos emulam em seus comerciais e outdoors, como na figura acima. Nesta área, somos nós a potência que todos um dia gostariam de ser. Se seremos potência nas outras áreas, depende de nós mesmos, com ou sem mau humor...

domingo, 15 de junho de 2014

A VIDA SEM GOOGLE

Vendedora ambulante na entrada do Parque Olímpico em Beijing. O que ela está vendendo? O Google sabe responder? socorro!!
No inicio do ano, passamos 12 dias numa praia do Uruguai, Cabo Polônio, numa casa sem eletricidade e com água de poço. Foi uma grande experiência voltar a coisas de antes de mim mesmo, ao tempo dos meus pais e avós, numa mundo ainda sem o tal do conforto da vida moderna. Aprendi a valorizar essas coisas de economia de recursos, e conseguimos diminuir o consumo de água de nossa casa, por exemplo. Sou mais observador que era com coisas de deixar luz ligada sem necessidade. Minha avó ficaria orgulhosa de mim.
Agora, passei por outra experiência limite: nos quinze dias que passei na China, não pude usar nem Google, nem Gmail nem Facebook. “Dar um google” ou “google something”, como dizem os americanos, lá simplesmente não cola. Você acessa uma vez e depois o botãozinho fica girando, girando, girando e depois de uns quinze minutos diz que aquela pagina não pode ser acessada.
Fazer o quê? No meu caso foi ficar literalmente sem, pois os instrumentos de busca que tem por lá são em chinês. Como entender aquela algaravia de símbolos, que nos deixava atordoados desde o aeroporto até o hotel e depois nas ruas nas lojas? Foi uma experiência de me sentir completamente analfabeto, completamente estupido. Aliás, essa é a essência da experiência no estrangeiro: virar um completo idiota que não sabe comprar um pão na esquina, nem qual ônibus e trem vai pegar, que mal consegue dar um obrigado sem dar bandeira.
Qual a saída? Não há saída, a não ser o aeroporto. O Bing, se me perdoam os seus defensores (se há algum!) é uma pálida experiência. Digitar as páginas diretamente no , como se fazia antigamente, é uma saída. Até me lembrei de coisas de antigamente (dez anos atrás!) quando se fazia essas coisas sem buscar primeiro no “oráculo”.
Outra coisa que me ocorreu foi a nossa total dependência dessa coisa que se chama Google. Os chineses, ciosos da sua independência, trataram logo de dar um basta e criar uma base de busca na qual eles confiam e podem manipular.  Tanto chineses quanto o resto do mundo (é assim a divisão que os chineses fazem do mundo, aliás) estão expostos a este jogo onde nossa privacidade está circulando por aí livremente, pra ser usada contra nós por governos e empresas de marketing - não necessariamente nessa ordem. A exposição de nossas vidas, sentimentos e ideias nos dias de hoje é tão cotidiana e ao mesmo tempo absurda que as longínquas noções orwelianas do passado hoje são um mero entretenimento para milhões.

Não sei o que vai mudar, mas estou nesse momento dando outro valor as experiências de tentar viver um pouco mais fora dessa Roda-viva e tentar dar um sentido a vida que não seja essa exposição boba e narcisista que fazemos hoje nos espaços virtuais. A vida e o mundo são maiores que isso. Mas não podemos esquecer de seu poder e de sua abrangência. Acho que a vida sem Google me indica esse caminho, o qual eu não sei se vou conseguir trilhar, seja por preguiça de fazer outra coisa, seja pela mera necessidade de faze-la. O que inclusive já estou fazendo ao postar estas maltraçadas.