Paisagem dos arredores de Pequim, vista da janela do avião |
No dia da minha partida pra Pequim, estava cansado com os
preparativos da viagem, pra deixar tudo “mazomenos” em ordem antes de uma
viagem mais longa. Quando me despedi da Maria José e entrei no ônibus, lembro-me
de ter visto um adesivo num carro escrito: “Brasil Vergonha”. Não sei de que, o
brilho do sol não me permitiu ler mais. Vergonha de quê? Não consegui entender.
Dormi um pouco e quando acordei, na marginal, um pôr do sol
pálido e tranquilo contrastava com a barulheira do transito. Tive inclusive um
pouco de dor de cabeça. Quando chegamos ao aeroporto e descemos do ônibus, não
tinha ninguém pra conferir os tickets de bagagem. Uma senhora campineira ao meu
lado, cheia de malas, olha para os céus, e clama, com ironia: “é o Brasil”.
Corta. Depois de 26 horas e viagem e tantos quetais, eis que
chegamos em Pequim. É um aeroporto enorme, com dois terminais tão afastados que
temos que pegar um trem interno para pegar nossas bagagens. Depois de passar
pela imigração, com seus funcionários com cara de policial, fui pegar as malas.
Havia uma série de avisos para conferir suas bagagens com o funcionário. Qual
funcionário? Peguei minhas malas e me fui, olhando receoso para o lado, lembrando-me
da senhora campineira.
Fiquei pensando nessa historia de “Brasil vergonha” e “ai, esse
é o Brasil!”, que escutamos todos os dias nas ruas, nas revistas e jornais,
nas redes sociais e mesmo na mesa da sala de jantar. Eu, que saiba, só posso
ser brasileiro, não tenho como pedir cidadania em outro lugar como muita gente
que pode e faz. Nada contra, mas nunca senti falta.
(Às vezes brinco que só posso pedir cidadania no Xingu.
Porém, dado nosso histórico de relacionamento, duvido que eles lá me deem passaporte, e com razão).
Entretanto, o que é a vergonha? É com a falta de educação do
povo? É com a miséria nas ruas? É com a corrupção, o patrimonialismo e com o
preconceito das “elites brancas”? É com a plebe rude e rouca das ruas? É com os
sindicalistas e sua “República Sindicalista” sempre a apavorar os sonhos dos
patrões? Parece estranho, mas quando se
articulam estas frases, elas estão sempre com “Eles, elas” como sujeito. Nunca “nós”.
Nós não somos culpados, por ação e/ou omissão, das nossas mazelas nacionais? O que fazemos para sana-las, a sério?
O Brasil não é o melhor país do mundo, muito menos o pior.
Mazelas têm até na Noruega. Temos problemas seriíssimos e uma estrutura de
sociedade que não ajuda muito. O acesso a educação é, na minha modesta opinião,
o maior gargalo nacional. Vontade sincera de mudar, de incluir e educar deve
ser vista com carinho. Quem realmente quer mudar pra incluir?
Não me convence o discurso da vergonha. Não tenho vergonha
de ser brasileiro. Tenho vergonha sim de mazelas, de injustiças e de
descalabros, como rotineiramente acontecem por aqui. Mas isso nunca vai me
fazer querer ter outro passaporte, nem um endereço no exterior. O que acho que tem que mudar eu
mudo na minha pequena vida – educando pessoas (e me educando), discutindo questões
importantes, e tantas outras coisas da cidadania.
É preciso para com a vergonha, com a culpa e outros
sentimentos desse naipe. Precisamos é fazer a massa, assentar os tijolos,
colocar o cimento, acender o fogo, chamar os vizinhos e viver, viver , viver.
Sem vergonha.
PS - escrevi este texto antes dos 7 a 1, evidentemente
PS - escrevi este texto antes dos 7 a 1, evidentemente