Vista panorâmica do 6° RI, em Caçapava, onde os escoteiros pernoitaram |
Não se pode dormir sossegado à beira de uma grande estrada,
como a que atravessava o Vale do Paraíba em direção ao Rio de Janeiro. Os escoteiros
souberam disso bem cedo. Para ser mais exato, as 6 da manhã. Por ali circulavam
os caminhões que levavam leite para a Indústria de Laticínios de Campos do Jordão.
Havia também outras grandes indústrias de laticínios, como a Vigor e a Armour.
Como registra Lydio em seu diário, pelo menos leite nunca
faltou nesta etapa da viagem. Frequentemente, os produtores lhes davam litros e
mais litros de leite, que eles bebiam com o entusiasmo de bezerrinhos.
Naquele dia, entretanto, eles haviam caminhado sem descanso
até umas onze horas. Era preciso, para recuperar o tempo perdido. Cansados e
com fome, eles perguntaram pela comida ao chefe Beto. Chefe Beto respondeu-lhes
que havia sobra do só um pouco de comida, mas ela era só para ele: "Cada um por
si e Deus por todos”, acrescentou.
Dito isso, ele pegou um belo sanduiche de presunto e queijo
e um resto de leite e começou a saboreá-lo na frente dos outros. Para os
outros, só havia leite. E foi o que eles almoçaram.
Lydio comenta que estava anotando isso em seu diário para
que todos possam sabe que a viagem deles não foi um mar de rosas. Em alguns
momentos, a vontade de jogar tudo para cima e desistir eram muito grandes.
Entretanto, não se sabe como, “só o
esforço hercúleo e a união dos quatro”, desiludidos pela falta de
consideração do Chefe Beto, “é que
garantiu o sucesso da missão”. Mas isso era somente a metade do dia.
Logo logo uma grande duma chuva os apanhou no descampado,
obrigando-os a se socorrerem numa choupana abandonada. Ficaram ali um tempo,
esperando a chuva passar. Quando passou, retomaram o caminho em direção a Caçapava.
As três e meia da tarde passaram pela vilinha de Eugenio de
Melo, que Lydio notou ter somente “umas
vinte casas e uma igreja católica”. Ali, pararam numa vendinha e se
fartaram de comer biscoitos e pão com queijo e mortadela. Chegaram ao luxo de
tomar um guaraná cada um.
Á tardinha chegaram em Caçapava, lá, tinham destino certo: o
quartel do 6° Regimento de Infantaria. O 6° RI era uma das mais antigas e
famosas unidades do exercito brasileiro. Estava em Caçapava desde 1919, mas a
unidade já havia participado da guerra do Paraguai. Entre 1915-16, foi
mobilizado na repressão á rebelião do contestado. No ano seguinte, em 1943, o
6° RI, juntamente com o 11° RI de São João Del Rei foi parte da FEB, tendo
participado de praticamente toda a campanha italiana. Mas isso é futuro.
Neste dia, os chanceleres discutiam se ficariam neutros ou
se alinhariam com os Estados Unidos. O governo Vargas, tendo garantido a siderúrgica
de Volta redonda com dinheiro americano, já sabia que lado tomar. Lá na Europa,
era mais um dia de ocupação alemã. No Japão, tropas australianas tentavam
impedir o avanço japonês.
Em 17 de janeiro de 1942 os escoteiros foram alojados no 6°
RI de Caçapava, onde só deu tempo de largar as tralhas no alojamento e subir rápido
para pegar a boia. Depois, de banho tomado, foram levados por um suboficial a
conhecer Caçapava.
Lá, eles visitaram a Radio Sociedade de Caçapava e o Caçapava
Tênis Clube. Lá, tinha um sarau dançante, mas Milton, Manduca e Canário,
cansados, voltaram ao quartel. Lydio e Beto ainda tiveram forças para ir ao
cinema. Lá, segundo Lydio, viram o seriado “besouro Verde” e depois um filme
policial.
Quando voltaram para o quartel ainda tiveram tempo de ouvir
no radio o final de Brasil e Argentina pela Taça Sul-americana. A argentina
ganhou, mas os meninos ficaram felizes ao saber que Caju, o grande goleiro
atleticano e da seleção fora a grande sensação da partida.
A chuva ainda caia lá fora, e fazia frio. Os meninos, dessa
vez bem protegidos, puxaram as cobertas e dormiram;