quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

A MARCHA DOS ESCOTEIROS 77: LÁ NO ESTÁCIO



(Estamos no mês de fevereiro de 1942. Enquanto o mundo está em Guerra e o Brasil segue sob a Ditadura do Estado Novo, cinco escoteiros de Antonina (PR), entre 15 e 18 anos, percorreram 1250 quilômetros numa marcha a pé rumo ao Rio de Janeiro para entregar uma mensagem para Getúlio Vargas. No episódio de hoje, 27 de fevereiro de 1942, enquanto Beto, Antônio (Canário) e Manoel (Manduca), Milton e Lydio  passeiam de bonde pela Cidade Maravilhosa. Onde será que eles vão?)

O calor naquele dia era de fritar ovo no asfalto.

Parecia que não havia mais nada pra fazer no Rio de Janeiro. Agora, fazia quase um mês que eles haviam chegado à cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, cansados e no limite de suas forças. Um longo mês em que tanta coisa tinha acontecido com eles, onde eles haviam visto e feito quase de tudo. A missão estava cumprida. 

Entretanto, havia uma coisa que eles precisavam fazer: Os rapazes ainda tinham muitos passes de bonde pra gastar. Neste dia 27 de fevereiro, uma sexta feira, Lydio e Milton resolveram passear por mais algumas favelas. Milton estava querendo ir, mas estava receoso de ir sem companhia. 

Neste dia, Milton e Lydio visitaram o Morro do Cantagalo e depois foram ao grande bairro do Estácio. A região de Estácio de Sá, ou mais simplesmente o “Estácio”, é uma importante área do Rio de Janeiro. A antiga área de Mata Porcos, onde havia um quartel no início do século XIX, era agora um bairro afluente e importante. 

Nos inícios da República, a cidade foi objeto de diversas políticas higienistas, que causaram imensos transtornos para a população mais pobre. Durante a política de “Bota-Abaixo” do prefeito Pereira Passos, as populações expulsas das imediações de Mata-Porcos pela terrível política foram se localizar no vizinho morro de São Carlos. São Carlos foi também um berço de muitos consagrados compositores cariocas, como Luiz Melodia, entre outros. 

Também no Estácio é que surgiu a primeira escola de samba da cidade a Deixa Falar. Era liderada por uma lenda do Samba, o compositor Ismael Silva. Dono de um senso lírico apurado e frequentado as rodas de malandro da região, Ismael foi um dos muitos responsáveis pelo surgimento do samba moderno, nos anos entre guerras. 

Mas tinha muito passe pra gastar. Milton e Lydio também estiveram nos morros do Salgueiro e Portela. Desta vez foi diferente do dia anterior, quando Lydio sentiu-se pouco à vontade no Morro da Mangueira. Naquele dia, contando com a presença de Milton, o sentimento de insegurança foi quase inexistente. 

Entretanto, Lydio atribuiu a relativa segurança que sentiu à farda. Afinal, os dois passeavam fardados de escoteiro. Como não foram molestados, Lydio entendeu que a população respeitava muito a farda escoteira. 

Milton, que era um novato em favelas, comentou que ficou assustado com o que viu. “Como pode aquele povo viver daquele jeito?”. É a pergunta mais importante do Brasil até hoje, para a qual a sociedade anda em busca de solução . 

Talvez saibamos a resposta para a pergunta de Milton Oribe quando o morro descer e não for carnaval. Quem sabe?

Os dois escoteiros tinham mais o que fazer. Aquele era o último dia de Rio, e eles tinham que aproveitar. Passaram praticamente todo o dia andando de bonde, de norte a Sul, de leste a Oeste da cidade. Já com os olhos de saudade, despediram-se da Cidade maravilhosa. 

Não sabemos se eles terminaram todos os passes que tinham. Sabemos que eles tentaram sinceramente acabar com eles. Mas uma coisa ainda os incomodava. 

Enquanto andavam feito loucos de bonde pela cidade, Lydio e Milton lamentaram que percorriam a cidade sozinhos. Manduca, Canário e Chefe Beto não participavam destas aventuras. Cada um do seu jeito, cada um por seu motivo, acabavam ficando enfurnados no Colégio Militar. 


Seria saudade de casa? Seria a ansiedade com a volta, que ocorreria em poucos dias? Toda aquela cidade a disposição deles, cidade com todas as belezas e contradições possíveis estava ali, aos olhos deles. Por que será que não aproveitavam?


Milton e Lydio pegaram todos os bondes que deu. Depois, voltaram ao Colegio Militar para compartilhar suas aventuras com os colegas. Agora, nos dias que faltavam, eles tinham muita gente pra se despedir.

2 comentários:

  1. A hora da despedida se aproxima, e toda despedida é sempre difícil.

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    1. Entre a saudade de voltar e a saudade de ficar estamos todos nós, não é, Edson?

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