sexta-feira, 31 de maio de 2019

PROPRIOLAVUS


(ilustração Julian Fagotti)
A Paleontologia Imaginaria não é futebol, mas também é uma caixinha de surpresas. Entre os fósseis imaginários que estão catalogados ou descritos já lá se vão milhares, como comprova a produção da Imaginary Paleontology Review, um dos periódicos de maior impacto do mundo científico imaginário.
Um destes fósseis, entre tantos outros, é bastante singular pelo fato de não ser um fóssil. Trata-se do propriolavus. A história é longa, e vai ser contada aqui um tanto abreviadamente, dada a exiguidade de tempo e espaço. Ou seja, temos mais o que fazer...
O propriolavus não é nenhuma novidade na escala do tempo paleontológico.  Desde a antiguidade se conhecem estas feições:  trata-se de feições aleatórias nas rochas, preenchidas por cimentos ou óxidos, muitas vezes dando a impressão de formar figuras. Em cientifiquÊs são chamados dendritos. Nestes dendritos, uns veem a Virgem Maria, outros veem um coelho. Outras ainda, um sapo engolindo uma estrela. Foi descrita também um quati malhado e uma concha de amonite. A maioria, entretanto, nada vê. Porquê é só uma mancha na rocha, e não um fóssil.
Aristóteles citou uma destas impressões em sua Física, volume II (hoje perdida), recuperada numa citação de latina de Flavius inflavius: “em terras da Capadócia acharam muitas destas figuras, que não querem dizer coisa nenhuma. Lá, são chamadas de propriolavus”. Na Idade Média tal feição foi descrita por Santo Agostinho, referindo-se a elas como “imposturas da pedra”.
No mundo islâmico, esta figura foi descrita por Ibn Sina, também conhecido na Europa como Avicena. Ibn Sina descreveu tais feições como imposturas e como alucinações que a luz do sol poderia provocar. Para Al Jabr, um dos mais famosos alquímicos islâmicos, o propriolavus era somente fruto da imaginação. Na tradução latina de al Jabr, realizada no século XIV pelo sábio bizantino Constantino da Beócia, o propriolavus foi descrito como “parente do azinhavre e do azebre”.
A história do propriolavus começa a mudar com a leitura da obra do padre Anastasius Kircher. Em seu texto “quae et nos credimus, quod impostor esset propriolavus”, Padre Kircher coloca em questão se o propriolavus seria uma impostura.  Ou, então, uma mera brincadeira da Natureza, ou lusus naturae, como se dizia naquela época.
O texto kircheriano chegou a Inglaterra, onde recebeu uma leitura atenta de Stebe de Bannon. Stebe de Bannon, como sabemos, que estava na época envolvido numa conspiração para assassinar metade das monarquias europeias e instaurar um reino cruzado na Europa Ocidental. Descoberto seu plano, foi esconder-se na América.
Em suas andanças pelo continente norte americano, Stebe de Bannon encontrou vários espécimes do propriolavus, alguns com o mau cheiro característico. Não se sabe exatamente como, num destes trabalhos subterrâneos de Stebe de Bannon, o propriolavus auto-intitulou-se fóssil, com o nome científico de Olavus decarvalhus. A seção tipo onde ocorreria o presumido fóssil seria a região de Richmond, na Virginia. Coberto de razão, o propriolavus começou a ser estudado por diversas pessoas em diversos lugares da América Portuguesa.
Consta que o mineiro Silvério dos Reis foi um dos maiores especialistas no estudo do propriolavus. Apaixonado pelo estudo do propriolavus, Silvério dos Reis chegou mesmo a enviar alguns espécimes para o filósofo Emanuel Kant, que então estava se interessando por assuntos de Paleontologia. Mas o eminente filosofo achou o propriolavus sem importância, e sequer respondeu as cartas de Silvério dos Reis.
Revoltado com a ausência de resposta, Silvério acusou o então alferes Joaquim Jose da Silva Xavier de haver sabotado seu contato com Kant. Silva Xavier sofreu então um sério assassinato de reputação, orquestrado pelo propriolavus, que via em tudo sinais de perseguição. Como se sabe, o Alferes, ao final, foi condenado a morte na forca e diversos outros cidadãos mineiros tiveram seus bens confiscados e foram enviados para o exilio por conta das maquinações de Silvério do Reis e do propriolavus.
O autointitulado fóssil Olavus decarvalhus não foi muito bem aceito na comunidade cientifica. A maior parte dos pesquisadores sequer reconhecia sua existência. No entanto, sempre coberto por camada e mais camadas sedimentares de razão, o Olavus decarvalhus estava sempre acompanhado de um pequeno grupo de leigos que acreditavam piamente em seu caráter fossilífero.
Durante um certo período geológico, chegou a ter alguma relevância, inclusive poder. Chegou a ser considerado o suporte de espécimes unicelulares como o Velez sp e o weintraubius balburdicus. Mas quando começou a abrir mais fortemente sua boca, o Olavus decarvalhus foi se tornando mais conhecido. Quanto mais conhecido, menos estudiosos acreditavam nele.
O propriolavus extinguiu-se totalmente ao fim do Antropoceno inferior. Deixou, em vez de impressões fósseis, um sem-número de dívidas para seus seguidores pagarem.




 (a Paleontologia Imaginária é um ramo da Paleontologia que trata de animais incertos; é um ramo do conhecimento que faz fronteiras com a paleontologia, a geografia, a física molecular, a psicologia e com Morretes (PR). Como membro da Sociedade Brasileira de Paleontologia Imaginária (SBPI) e colaborador da South American Review of Imaginary Paleontology, periódico classe A1 da CAPES, venho através deste blog fazer a divulgação científica da Palentologia Imaginária para o publico interessado em ciências)






Um comentário:

  1. Jeff
    Excelente postagem
    Sempre é bom atualizar o conhecimento.
    Olavus de Car(v)alhus sp. é na verdade um incertae sedis.
    Grande abraço

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