quarta-feira, 2 de maio de 2012

UMA PAISAGEM SUIÇA

Karl Von Koseritz, jornalista teuto-gaúcho, foi um importante jornalista do periodo imperial; essa é a primeira visita que nos fez, em abril de 1883. 
Karl Von Koseritz (1830-1890)


Cerca de 10 horas e surgiu à vista a pequena cidade de Antonina. Como num cenário levantavam-se dos dois lados, principalmente do direito, as cadeias de montanhas e a vista é das mais imponentes que já conheci, absolutamente uma paisagem suíça. Assim como a estrada do Paraná é absolutamente uma estrada suíça. Eram 10 horas e nós estávamos justamente sentados para almoçar, quando a ancora caiu no belo porto de Antonina que é livre de qualquer obstáculo.
 Se eu não soubesse que o Brasil é incompreensível eu acharia estranho que a estrada não tivesse partido de Antonina, em vez de Paranaguá, para Morretes e etc. em todo caso Antonina é a localidade de maior futuro e só a falta de estrada de ferro poderá deixá-la para trás. A competição que existe entre Antonina e Paranaguá é semelhante à que existe entre Pelotas e Rio Grande. Para Paranaguá – como para Rio Grande – foi levada uma absurda estrada de ferro, e Antonina se queixa,- como Pelotas, - do fato de não possuir uma alfândega. Sempre há aqui uma diferença: Pelotas ganhou aos senhores de Rio Grande uma mesa de rendas alfandegada. Desci em Antonina com o amigo Rosch, que tinha um conhecimento da terra igual ao que já demonstrara sobre a estrada do Paraná. Antonina tem um bonito cais e é uma gentil cidadezinha, não completamente limpa, mas, em todo caso, mais limpa do que Porto Alegre. O pior estado sanitário é devido à extraordinária extensão das marés; a maré baixa deixa muitas quadras cobertas de lama. Sobre a qual queima um forte sol; está claro que aí não deverão faltar os miasmas. 
Coisa inesperada para mim foi a existência de ruínas quase românticas, velhos panos de muro cobertos pela vegetação, que devem restar do tempo das primeiras habitações. Grandes quantidades de urubus pousavam sobre quase todos os tetos ou passeavam nas ruas, como, entre nós, as pombas. Logo chegamos à hospedaria da velha Rosskamm, aquela casa que todos os alemães do Paraná conhecem. Lá nos deliciamos com a excelente cerveja nacional de Morretes, que o amigo Rosch pretende ser o único preservativo contra a febre palustre, e estivemos em animada conversação com os outros passageiros desembarcados. 
Eu esperava atravessar Antonina incógnito, mas não pôde ser, porque apenas a velha Sra. Rosskamm ouviu o meu nome na nossa conversa, dirigiu-se a mim perguntando: “o senhor é o Koseritz, cujo calendário e cujo jornal possuo?”. O incógnito tinha ido por água abaixo e não seria utilizado mais tarde,pois pouco depois, quando passeávamos pela calçada irregular, entre ruínas e urubus, aproximou-se um dos sólidos carros que viajavam até Curitiba e desde longe, de dentro dele, o coronel Schuster-Schutz lançou-me um cordial “seja bem-vindo”. Voltamos com ele à casa da Sra. Rosskamm e passei uma hora com o velho e caro amigo, que se tinha curado de uma febre de 13 meses, contraída na colocação de telégrafos no Paraná. Schuster-Schutz envelheceu, mas conserva fiel sua raça de outros tempos e é sem duvida um homem que prestou ao Brasil os maiores serviços. Ele colocou quase toda a rede telegráfica do império. Pelas 4 horas nos despedimos da sra. Rosskamm e regressamos para bordo. 
Na volta pela praia vimos uma coisa extraordinária: quatro gigantescas rodas que um talentoso engenheiro fez construir há tempos para, com seu auxílio, conseguir transporte através da serra! Lá estão elas, apoiadas numa ruína, antigo e triste testemunho da insensatez dos homens, que a tornou inúteis e vencidas. As rodas gigantes são sem duvida a coisa mais notável de Antonina. 
Quando chegamos a bordo o exército vitorioso já tinha embarcado, com exceção do comandante e seu estado maior. Mas lá vêm eles, numa barca militar embandeirada, com enormes bouquets de flores nas direitas possantes, e com flores em todas as casas de botões. Como se vê, Antonina honrou os “bravos vencedores” de Curitiba. Assim que o leal Eneias chegou a bordo com seu estado maior, largamos e breve estávamos de novo diante de Paranaguá, onde recebi a comunicação telegráfica de que o ministro Ávila nos aguardava desde o dia anterior em Santos. Chegou-nos, por cima, a bordo, ainda uma companhia de artistas cavaleiros, com seus cavalos magros e não menos magras raparigas e, ao cair da tarde, passamos, repletos, pela barra de Paranaguá, diante da alta ilha e do belo farol, com a agradável certeza de termos a bordo pelo menos 600 passageiros.

Bordo do “Rio de Janeiro”, 16 de abril de 1883.

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