Avenida Nenê Chaminé, sem número |
No começo
do mês, estava em Nova
Friburgo voltando de uma vistoria a locais onde haviam
ocorrido escorregamento de terra em janeiro ultimo, em companhia de, entre
outros, Claudio Amaral, diretor do DRM – o Serviço Geológico do Rio de Janeiro.
Em toda o megadesastre, ele era quem falava pelo corpo técnico que estava
cuidando dos risco geológicos na região, e, por força disso, era muito
conhecido e requisitado pela população. Numa caminhada de cerca de trezentos
metros ele foi parado pelo menos por duas vezes, por pessoas que vinham perguntar
sobre a situação de risco de sua casa, de sua rua especifica. Educadamente, Claudio respondia a cada um, evitava polêmicas e fazia o possível para dar a melhor informação
possível num universo intrincado onde ele, na verdade, mandava pouco. Pelo lado
das pessoas, via-se claramente o desespero de quem já tinha passado por poucas
e boas no passado recente. Muitos tinham sobrevivido por sorte. E não sabia
direito a quem recorrer, a quem indagar sobre os riscos que estão por vir com o
começo da próxima estação das chuvas.
Cerca de
dez dias depois, estava na Deitada-a-beira-do-mar com meus alunos, subindo os
morros e fazendo observações. Conversei com diversas pessoas, em praticamente
todos os bairros ao redor do morro. Da mesma forma que as pessoas em Nova Friburgo , o que
eu vi foi muita desesperança. Pessoas que perderam tudo e que se encontram
desesperadas e perdidas, como o Edson, que interrompeu nosso trabalho achando
que estávamos desrespeitando ou, pior, roubando a casa de sua mãe na
laranjeira. Aos gritos, e completamente torrado, como se diz em antoninês, ele
nos ameaçou, pedindo aos berros para que fossemos embora dali. Ao conversar com
ele procurei entender sua reclamação e acalmá-lo. Era uma criança grande,
literalmente sem chão, com a casa da mãe destroçada e cheia de lama, num cenário
realmente aterrador. Chorou muito, pediu desculpas, se disse atordoado pelo
sofrimento. Quando se acalmou, pediu dois reais. Não sei em que foram investidos
os dois reais que dei a ele, mas pra coisa boa não foi.
Conversei com
outras pessoas, melhor situadas que o pobre Edson. Tinham aonde ir, casa de
parentes onde ficar, e não se sujeitavam a morar nos abrigos. “é muito
humilhante”, me disse uma senhora que encontrei no Tucunduva. Na Laranjeira,
uma mulher nos contou que as casas por ali estavam sendo paulatinamente
depredada por bandos de rapazes desocupados, que buscavam as casas abandonadas
pra fumar crak. Aqui e ali, via-se que algumas casas estavam sendo reocupadas,
outras se viam guris entrando e saindo, num cenário que poderia ser de guerra. Mas
é Antonina.
No bairro Floresta,
em Morretes, conversei com seu Arlindo, um próspero agricultor que perdeu
praticamente tudo na catástrofe, inclusive uma irmã. Não queria nada, nem cesta
básica: “aqui não tem vagabundo”, disse, com orgulho de quem tira seu sustento
da terra, e com suas próprias mãos. Uma terra, aliás, toda virada do avesso,
cheia ainda de lama, pedras, troncos e restos de casas e carros. Mais pra
frente, já havia terra livre de tocos e arada, esperando pra plantar. A indefinição
do governo sobre o que fazer com a área não pode durar pra sempre, diz ele. Não
há tempo a perder, a safra tem que ser plantada a tempo. A maior reclamação de
seu Arlindo é não deixarem mais plantar na sua propriedade, agora declarada área
de risco.
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