quinta-feira, 26 de abril de 2012

MONSTRUMENTOS


Mais um grande monumento da Deitada-a-beira-do-mar, os urubus do mercado, clicados por Eduardo Bó

Durante as discussões que houve semana passada na blogosfera por conta da minha crônica “Munira e o Óbvio ululante”, uma coisa me chamou a atenção – mas não, não se trata de política ou eleições. Trata-se, isso sim, dos monumentos da Praça Romildo Gonçalves Pereira, a popular Feira-mar. Colocados ali na gestão de Leopoldino Abreu ou de Pereirinha, tanto o Monumento à Bíblia quanto o “barco adernado” sempre foram motivo de muita reclamação, tanto dos bagrinhos quanto dos turistas. Tanto que, no calor da discussão da semana passada, meu amigo Masca chamou-os de monstrumentos, um excelente neologismo para este tipo de obra.
Curitiba também tem vários desses monstrumentos. O mais famoso e, de longe, o mais popular, é a estátua do papa João Paulo II no Bosque do Papa. Não há quem não sinta algo estranho ao contemplar a estatua do falecido pontífice. Todos acham a estátua feia ou estranha, e alguns até veem um olhar diabólico no que era pra ser a representação de um papa que nem esfriou na cova e já é beato. Outro famoso monstrumento curitibano é o “Cavalo Babão” do Largo da Ordem, mais uma das muitas esquisitices da gestão de Rafael Waldomiro, o Greca de Macedo.
O Monumento À Bíblia é banal do ponto de vista artístico. Já o Barco Adernado é artisticamente bem elaborado, e foi feito por uma artista plástica curitibana, não me lembro do seu nome agora. Imagino que seja mais fácil para as pessoas se sentirem a vontade com o monumento à Bíblia do que com o Barco. Como toda obra de arte moderna (Valei-me São Geraldo Leão e São Bó!), a sua significação não vem pronta – o espectador é que tem que construir a sua. Você olhar um quadro cheio de rabiscos e achar uma coerência ali é diferente – e mais difícil – que achar a coerência de uma Mona Lisa, onde os significados estão mais evidentes.
O problema com os monumentos é que você tem que sentir identidade com eles. Qualquer um que olhe a Torre Eiffel faz mentalmente várias associações com França, franceses, Paris. Estatua da Liberdade, Nova York. Os porto-alegrenses se orgulham da estátua do Laçador, que fica na entrada da cidade. Nós, brasileiros, nos sentimos bem quando vemos as formas de Brasília, o Cristo Redentor, o Corcovado. Eles, os monumentos, falam de nós para nós mesmos, nos dão uma identidade.  Esse é o seu papel e o seu charme.
Em nosso caso, tanto o Barco Adernado quanto o Monumento à Bíblia são coisas que não dizem nada para as pessoas. O monumento à Bíblia porque é feio esteticamente, sem nenhuma conotação religiosa – ou não – nesse meu achar. O Barco Adernado eu acho bonito, mas reconheço que não tem nada a ver com as pessoas que vivem e passam todo dia por ali. Não dizem nada e – para os mais apressados - ainda ocupam espaço. Os dois são exemplos de Monstrumentos.
Monstruments são gerados quando a municipalidade tem dinheiro em caixa e não sabe como gastar. Nessas condições, ela faz qualquer coisa, mesmo coisas bonitas, mas coisas que não dizem nada, que não dialogam com a cidade ao seu redor. Às vezes dá certo, noutras o sonho da razão produz monstrumentos, parafraseando o célebre quadro de Goya, pintor espanhol do século XIX.
Por outro lado, qual o monumento, natural ou artificial, que fala ao coração da Deitada-a-beira-do-mar? Qual seria o monumento que nos une e nos representa, qual seria  a nossa Torre Eiffel? Seria a Igreja na colina, o mais óbvio deles? Seria a Fonte da Carioca? A Fonte do Batel? A igreja de Bom Jesus do Saivá? O Conjunto da Obra, ou seja, o conjunto mar, morro, mangues e cidade? Qual é a sua opinião, nobre leitor desse humilde blog?

2 comentários:

  1. O tal Barco Adernado, é obra da escultora Ligia Borba, contratada pelo então prefeito Ironaldo Pereira de Deus, por solicitação dos evangélicos de plantão. Pelo meu modesto conhecimento, achei a obra interessante do ponto estético e também da concepção, que abstraía a figura da bíblia - solicitada pelos religiosos. A referido monumento, além de conter aquele corpo material de concreto, se completava com duas pedras de mármore branco, colocadas na horizontal sobre a parte mais baixa do bloco. Infelizmente a parte escultórica - as mármores - foi roubada e além de incompleta passou a fazer parte de um todo abandonado.
    A proposta do monumento não satisfez os religiosos, e o prefeito encomendou uma outra mais obvia, que parece um epitáfio e se encontra no início da praça.
    Para esclarecer a quem interessar.

    Eduardo Bó

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  2. amem, Eduardo! com isso são esclarecidos alguns mistérios...o barco era uma bíblia também...obrigado pelo esclarecimento e abraços!

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