sábado, 26 de maio de 2012

quarta-feira, 23 de maio de 2012

O LIVRO DE THIAGO

o poeta antoninense Thiago Peixoto (1876-1921)


Há cerca de um mês atrás, apareceu no Bacucu com Farinha um poema atribuído a Thiago Peixoto, o maior poeta antoninense de todos os tempos. Na sequência, algumas postagens denotaram que o poeta e sua obra estavam esquecidos da maioria das pessoas da cidade onde nasceu, e onde é nome de uma das principais avenidas de Antonina.
Pesquisei também o pouco que se sabe da vida de Thiago Peixoto. Pelo que vi, só existe um livro, o “Livro de Thiago Peixoto”, publicado por seus amigos Otavio Secundino e Bertier Oliveira em 1922, pouco após sua morte. Foi um tributo de amigos. Ali, além dos poemas de Thiago publicados esparsamente, haviam diversos necrológios escritos por um grande numero de amigos, desde Ermelino de Leão até Leôncio Corrêa. Pelo que se pode perceber, o livro foi publicado aparentemente à revelia de sua família, que segundo Otavio Secundino não forneceu nenhum detalhe ou poema para os editores. Mesmo a foto que consta no livro foi obtida por intermédio de terceiros.
Pelas parcas informações  que levantamos sabemos que Thiago Peixoto, autor do belo soneto Saivá, nasceu em 1º de março de 1876 em Antonina. Aí fez seus primeiros estudos. Jovem, em Curitiba,  escreveu diversos poemas publicados nas diversas revistas simbolistas que apareceram na capital paranaense no inicio do século XX. Tendo feito muito sucesso, no entanto retornou à capela, casou-se com D. Adília Peixoto e com ela teve 7 filhos. Pelo que se pode entender dos dados dispersos pelo livro, nesse seu retorno Thiago foi guarda-livros, participou do governo municipal e foi diretor do extinto Instituto Comercial de Antonina. Depois de longa doença (qual seria?) acabou por falecer triste e amargurado na Deitada-a-beira-do-mar em 23 de maio de 1921, há exatos 91 anos.
Não sei da autenticidade do poema que circulou na rede. Ele, pelo menos, não consta dos tantos que estão no Livro de Thiago Peixoto. De toda forma, é melhor que as trovas apócrifas de Bento Cego que andaram vagando pela blogosfera recentemente. Seria interessante ver outros poemas de Thiago, além dos que estão publicados no livro citado.
É desperdício de bits reclamar de nossa memória histórica, quase a vaga lembrança da piada do português. Em vez disso, um anônimo muito inspirado propôs, também aqui no Bacucu, de uma verdadeira plataforma para a cultura, já que estamos em ano de eleição municipal. Entre outras coisas, o tal anônimo listou a reformulação da Biblioteca Municipal e a criação de um Museu Histórico, através de uma politica de preservação de documentos, fotos, mídias e objetos antigos. Da mesma forma, propõe a criação de um Arquivo Histórico Da Cidade. Este arquivo histórico, em minha opinião, deveria reunir documentos antigos e preservá-los, na forma de transcrições e coisas do gênero. Curitiba, com Romário Martins, fez isso em 1920, com a publicação de todos os arquivos da Câmara Municipal desde os primeiros tempos em 1693 até a República. O resgate de nossa memoria histórica, a par do tombamento que está sendo feito pelo IPHAN faria Antonina ter memória e, portanto, também história. Alguém se candidata?

sábado, 19 de maio de 2012

COMEÇA O INFERNO DA SEGUNDONA



Virgilio e Dante dando uma olhada na primeira rodada da segundona
Começou o Campeonato Brasileiro que vale alguma coisa, o Brasileiro da série B; vale, no mínimo, uma passagem para o titulo intercontinental do Atlético em 2014, segundo ouvi  do falecido presidente Rubens Passerino Moura, especial para o Pai Zinho News. Será?
Estou aqui acompanhando, com meu amigo Gusano, o até agora primeiro tempo em Joinville: até agora 2 a zero pro furacão, com gols de Manoel e Bruno Mineiro, depois de dois alçamentos de bola (que bonito!) de nosso ex-jogador em atividade, o eterno Paulo Baier. Gusano está ansioso, pois seu time o Pumas, deve jogar hoje as 18h (21h de Brasília), contra o Chiapas pelo campeonato mexicano. Tá mal o Pumas, terminou o apertura em 13º lugar.
Vários amigos especiais acompanham o rubro negro em sua temporada no inferno: Arthur Rimbaud, jovem centroavante do Lille, da França, além dos dois titulares, Dante Alighieri e o poeta Romano Virgílio. Dante está meio chateado, pois sua Fiorentina terminou o campeonato da bota em 10º, com 40 pontos. Já Virgílio sofreu com a sua Roma, que ficou em sétimo e ainda viu o rival Lazio conseguir vaga para as copas europeias. Acontece.
O Joinville diminui, gol de pênalti. Mas que merda!! Virgílio, andando por entre as almas penadas do inferno, faz uma cara de “eu já sabia”. Mas Dante Alighieri diz que Paulo Baier está jogando muito. E GOL!! Mais um passe de Paulo Baier! Fernandão! Uhu! Gusano me olha com uma cara de verme, enquanto Rimbaud dá uma risada amarela e toma mais uma dose de absinto. E daqui a pouco o quarto!  Renan Teixeira, aos 39’, amplia para o rubro negro!!4x1!!
Um primeiro passo. Pra quem terminou seu último brasileiro na rabeira, não custa terminar a primeira rodada em segundo, pois o América de Natal  ganhou de 5X2 do Goiás, jogando em casa. Nada ainda decidido no campeonato, Rimbaud saiu à francesa pra ver um show da Virada Cultural aqui em Campinas.  Estou aqui com Dante e Virgílio tomando uma loira gelada pra comemorar a estreia do Furacão na segundona. Maravilha. O bom do inferno é você tentar sair dele. Enquanto isso Gusano está  grudado na internet: daqui a pouco começa o jogo do Pumas. Sabadão esportivo é isso aí. 

sexta-feira, 18 de maio de 2012

O QUE SABEMOS DE BENTO CEGO?


O jornalista antoninense Nestor de Castro (1867-1906), em óleo de Alfredo Andersen. 


Nesses árduos tempos de blogosfera, alguém andou perguntando de Bento Cego, e o que se pode fazer para recuperar sua memória. A memória de Bento Cego eu não sei, mas sei quem é o responsável pelo fato dela – mesmo incompleta – estar acessível para nós, pessoas do século XXI: trata-se de Nestor de Castro.
Por uma feliz coincidência, hoje, 18 de maio, faz exatos 145 anos que nasceu Nestor de Castro, um dos maiores jornalistas do Paraná. Nestor de Castro nasceu na Deitada-a-beira-do-mar no ano de 1867, filho de Felipe de Castro e Ana Pereira de Castro. Nestor de Castro teve uma infância difícil – aos 4 anos de idade perdeu a mãe; aos 9 ficou órfão de pai.  Em Antonina estudou com o professor Manuel Libânio de Souza, com quem aprendeu as primeiras letras. Com dez anos, foi enviado ao seminário em São Paulo. Ali, foi protegido pelo influente cônego Manoel Vicente, capelista como ele.
Ao retornar a Antonina, em 1886, tentou a vida no comércio, mas não teve sorte. No ano seguinte, casou-se com Arminda Pinheira da Costa, mudou-se para Curitiba e iniciou-se no jornalismo. Trabalhou no jornal Dezenove de Dezembro, ligado ao Partido Liberal, logo se destacando com um ardente polemista. Foi muito amigo de Teófilo Soares Gomes, pai de Heitor Soares Gomes, o melhor prefeito de Antonina no século XX. Chegou a escrever peças de teatro, em parceria com Jaime Balão, musicadas por Augusto Stresser.
Durante a Revolução Federalista, como todos os liberais de seu tempo, participou do governo revolucionário em 1894 como secretário de estado. Com a derrota do movimento, foi obrigado a exilar-se. Nos campos do sul, ouviu muitas trovas de um cantador chamado Bento Cego, capelista como ele, e se interessou pela vida do poeta popular.
De volta a Curitiba, foi duramente perseguido pelo situacionismo governista. Passou, com sua mulher e seus 12 filhos, por grandes necessidades. Somente em 1902, por iniciativa de seu amigo Teófilo Soares Gomes, foi que Nestor de Castro foi convidado pelo governador Vicente Machado para trabalhar no jornal “A República”, de situação. Tratava-se do mesmo jornal que ele tanto havia combatido no passado.
Neste curto período, escreveu sua monografia sobre Bento Cego, provavelmente sua obra prima. Nestor de Castro juntou no texto as escassas informações que obtivera no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais, bem como cartas do cônego Manoel Vicente, que também pesquisou a vida do cantador do Registro. Ermelino de leão somente reproduziu o que Nestor de Castro encontrou.
Nestor de Castro faleceu subitamente aos 39 anos de idade, em 14 de agosto de 1906. Hoje, reconhecido por sua obra literária e jornalística, Nestor de Castro é nome de rua em Curitiba e é o patrono da cadeira de numero 33 da Academia Paranaense de Letras. Na sua cidade, como de praxe, pouco se sabe de um ardoroso e combativo jornalista, que um dia foi reconhecido, juntamente com Romário Martins, como um dos maiores jornalistas do Paraná.

Fonte: Samuel César, “O elogio do Patrono”, discurso na Academia de Letras do Paraná em 21 de janeiro de 1927; publicado em “Obras de Nestor de Castro”. Curitiba, Editora GERPA, 1945. 

quinta-feira, 17 de maio de 2012

CARTA ABERTA À NAPOLEÃO PELUSO JUNIOR

Caro Napoleão Júnior:

Confesso que ao chegar cansado em casa, depois de enfrentar meus alunos o dia inteiro, fiquei meio chateado ao encontrar seu “tijolo” de texto em meu blog. Como faço nessas horas, fui conversar com Gusano. Gusano, se você não conhece, é meu amigo engarrafado, o verme da garrafa de mezcal que trouxe recentemente do México. Gusano, o verme certo das horas incertas, me fez ver que, ao contrário do antagonismo que supomos existir, temos algumas coisas em comum. “Mas vocês não moraram na mesma rua?”, me perguntou Gusano com sua dialética de verme. Pois então.
Eu cresci, assim como você, na Rua Coronel Líbero, em minha opinião a melhor rua deste lado da Via Láctea. Ali, caro Napoleão, entre os dois postes do atual Teatro, antigo Cinema, aconteceram algumas das mais memoráveis partidas de futebol de minha vida. Em frente à atual casa de sua mãe, que foi durante muito tempo vizinha de minha casa, antes de você morar ali, teve muito futebol rolando, da melhor e da pior qualidade. Chegou a ter jogo de dez contra dez, e isso num tempo em que o tráfego de veículos era pelo menos o dobro do de hoje!
Se você tivesse morado ali naquele tempo, nos anos 70 e 80, poderíamos ter nos conhecido jogando bola, ou andando de bicicleta. Ou, então, brincando de mãe-baleia, que pegava de um ponto a outro da calçada. Quem atravessasse tinha que correr pra não ser pego. Se você fosse mais grandinho, podia ter brincado de polícia e ladrão, que em algumas versões abrangia toda a cidade, da Rua do Esteiro (sabe onde fica?) até o morro do Joubert, hoje velhinho (90 e poucos anos!) e reverenciado por todos como um grande prefeito do passado. Era muito divertido aquilo tudo.
Pois então. Por conselho de Gusano, nem li seu “tijolão”. Se você acompanhou algumas polêmicas aqui no meu blog ou no Bacucu com Farinha, onde o Neutinho gentilmente me cede o espaço, teria percebido que não sou uma pessoa boa, nem mesmo virtuosa. Por dentro, sou mau, muito mau. Egocêntrico, corrupto, devasso, perverso. Algaravias, garatujas e heresias, esse é subtítulo do meu blog e o meu subtítulo. Por isso mesmo, se eu procuro andar certo na vida, é porque quero distância de policiais e advogados. Não entendo nem quero entender de leis, e por isso mesmo procuro segui-las como um bom cidadão.
Desta forma, pela amizade que decerto teríamos se tivéssemos nos conhecido em nossa infância/adolescência na Rua Coronel Líbero, eu gostaria de te dar um conselho. Eu sei, conselhos, se bons fossem, não seriam dados e sim vendidos. No entanto eu te peço: largue a barra da saia e venha fazer parte de nossa turma. Faça um blog e vamos discutir. Aqui, na blogosfera dos bagrinhos, a gente faz como fazia antigamente na boa e velha Coronel Líbero: às vezes, damos umas caneladas uns nos outros, discutimos, brigamos. Mas sempre resolvemos as coisas entre nós. Levar as coisas para uma instância superior, como reclamar pro pai ou pra mãe – ou pro juiz – não resolve nada e deixa o cara marcado na turma – “aquele é o guri que foi chorar pitanga”. Acho que você, valente como se mostra, não quer correr esse risco, não é?
Bom advogado, você até pode ganhar a ação de calúnia que você move contra o Cequinel, esse nosso boquirroto amigo, sempre direto e sem papas na língua, mas com um coração enorme. Você ganha na Justiça. Mas em médio prazo politicamente você perde, e isso até Bento Cego já percebeu. Retire a ação contra o Cequinel e vamos discutir politicamente a candidatura de sua mãe. Você é inteligente e tem coragem, já demostrou isso.  Se ela for absolvida, concorrer e o povo votar nela, assim é a democracia, e eu me curvo à vontade popular. Mas, por favor, pare de fazer biquinho, porque isso é chato, assim como o tal “tijolão” cheio de leis e quetais que você postou no meu blog. Assim vamos brincar de verdade, num jogo que Antonina e seu povo tem muito mais a ganhar que essas nossas picuinhas de blogosfera. 

CONTRA A HOMOFOBIA



Apoio a luta contra qualquer tipo de discriminação por motivos de raça, cor, religião, crença politica, opção sexual e outras discriminações; só evoluimos enquanto sociedade quando paramos de nos matar por causa destas bobagens, sob o amparo de um estado laico. Essa postagem eu dedico a Alan, grande carnavalesco da Deitada-a-beira-do-mar, e que morreu de AIDS nos anos 90 no hospital Silvio Linhares sem qualquer tipo de ajuda por causa do medo - e da falta de informação - que todos, inclusive o pessoal de saúde - sentiam da doença. 

quarta-feira, 16 de maio de 2012

UM VISITANTE ILUSTRE



Neste último domingo, estava fazendo uns serviços em casa. Temos uma amoreira que está grande, e nesta época ela suja a calçada com seus frutos e nos dá um trabalho danado de limpá-la. Eis que toca o telefone. Vou lá correndo atender: do outro lado, escuto a voz de meu guia espiritual, pai Zinho de Obatalá. Sim, tenho um guia espiritual, o qual, apesar de entendido na metafísica do além, é ainda altamente tecnológico: “liga o Skype!”, me pede ele.
Fui até o escritório, liguei o computador no Skype e nos falamos um pouco. Pai Zinho me avisou que alguém estava querendo falar comigo. “Mas alguém quem?”, perguntei pra ele. Pai Zinho deu um sorriso de Mona Lisa e desligou o Skype, fazendo aquele barulhinho esquisito: birurum-bum!
No canto mais escuro do meu escritório começou a soar uma toada de viola caipira. Que susto! Um preto velho de barba branquinha, chapéu de palha e roupa toda rasgada tocando viola no meu escritório! Que diabos era isso? Mas ele tocava divinamente a viola e cantava uma canção:

Caro senhor Jeffinho
Escute aqui o meu canto
É o cego do Registro
Soltando seu triste pranto!

Nossa! Era Bento Cego, nosso grande cantor e poeta! Nascido no Registro, em Antonina, em 1821 e falecido em Cajuru, São Paulo, em data incerta. Grande cantador que percorreu o sul e o centro do Brasil desafiando os violeiros que encontrava em animados desafios de trovas. E Bento Cego estava ali, em meu humilde cantinho, tocando sua viola! Que honra! Fiquei pasmo de escutar, e ele emendou outra quadrinha:

Eu quero mandar recado
Ao amigo boca suja
Que andou falando na rede
De uma tal dita cuja

Não ligue meu caro amigo
Com o forte destempero
Quando mandam calá boca
É causa de desespero!

Fiquei ali feliz escutando o canto triste de nosso grande e popular cantor. Que riqueza de poesia, que versos mais inspirados! Não conseguia nem falar na presença de tão grande poeta. Ele prosseguiu:

Pode falar nepotismo
Pode falar mãe coruja
Mas quando for falar mesmo
Não fale que é ficha suja!

Ficha suja ainda não é
Pela lei do seu juiz
Perto do tal Cachoeira
Qualquer um é aprendiz!

Que poesia, que encanto! Bento Cego tocava com destreza sua viola e sua musica enchia todo o meu pequeno escritório. Foi tanto encantamento que nem consegui levantar dali pra chamar minha mulher, que estava entretida com as flores do jardim, pra vir ver o Cego cantar. Pensando bem, melhor não. Vai que ela não vê e não escuta nada e diz que estou pirando...

Pode falar do seu padre
E do juiz de lambuja
Só o que não pode mesmo
É chamar de ficha suja

O Cego não sabe das lei
Dos dotores divogado
Mas pra falá “ficha suja”
Fale com muito cuidado!

Por fim, Bento Cego terminou seu canto, largou as mãos da viola e deu um sorriso largo com seus dentes brancos. Sua imagem foi esfumaçando, esfumaçando, e sumiu por entre meus livros. Fiquei ali parado, sem saber pra onde ir, sem ter o que falar. A bela tarde de domingo lá fora, e eu ali parado, com a melodia da viola do Cego na minha cabeça. Que coisa!
Depois de ficar ali matutando qual a razão de tão ilustre visita sem poder atinar por que seria, lembrei que tinha uma calçada pra varrer. Mãos à obra! Se eu não cuidar de minha calçada ela vai pretejar com o sumo das amorinhas. Deus me livre de ficha suja, quero dizer, de ficar suja! E, antes que me esqueça: Viva o canto sem censura de Bento Cego!

segunda-feira, 14 de maio de 2012

NUNCA TANTOS CAPITÃES E DOUTORES

Capa da primeira edição do livro de Thomas Bigg-Wither, "Pioneering in South Brazil", de 1878

PARTE 1

O rebocador chegou às três horas, mais ou menos. Era uma embarcação pequena, de rodas, de vinte toneladas talvez, e, embora sendo curta a distância entre Paranaguá e Antonina, não podíamos esperar fazê-la em menos de quatro horas, considerando o fato de estarmos rebocando cinco barcaças carregadas.
Paramos em Paranaguá um quarto de hora. Com melhor conhecimento da cidade, eu diria que ela não podia ser muito sadia, cercada de brejos como se acha, e não só, pois, quando a maré baixa, vêem-se grandes extensões de lama em frente à cidade, expostas a um sol abrasador. Contudo, os moradores não se queixam de sua insalubridade, mas nem os do Rio de Janeiro o fazem da cidade em que vivem.
(...)
Toda a região, que se estende para o interior, por muitas milhas até as encostas da serra do mar, parecia ser imenso pântano, com um ou outro baixo montículo aqui e ali. Toda esta parte não era cultivada, naturalmente, e quem a olhasse sentiria arrepios. No lado oposto da baía, o terreno era montanhoso, cultivando-se ali o solo em pequena extensão. Estas observações foram feitas enquanto navegávamos rumo a Antonina, rebocando as barcaças na velocidade média de três milhas por hora. (...)
Nunca, pensei comigo, “o mais velho habitante de Antonina” presenciou a chegada de tantos “capitães” e “doutores” (descobrimos depois que teríamos de escolher um desses títulos, pelo fato de sermos engenheiros).
A fim de darmos ao nosso desembarque na província em que futuramente trabalharíamos aspecto festivo, abrimos uma de nossas caixas de fogos de artifício e foguetões de sinal, combinado de solta-los um pouco antes da chegada do navio à vila. O sol já se havia deitado há muito tempo quando chegamos à distância de uma milha de Antonina. A noite era escura e, portanto, favorável ao espetáculo. A um sinal convencional, o navio ficou iluminado pela abundancia dos foguetes, pistolões e rodinhas. No mesmo momento muitos vivas à Inglaterra, saídos de uma vintena de estentóricos pulmões, foram ouvidos. Quando o espetáculo ainda estava no auge, desprendemos, subitamente, o cabo do reboque e o pequeno rebocador, livre das barcaças pesadamente carregadas, encostou garbosamente no cais, resplandecendo ainda por cima e ao derredor pelos fogos que soltávamos, em grande estilo. Assim, mais uma vez, triunfalmente, desembarcamos nas costas do Brasil.
O espetáculo pirotécnico havia atraído uma pequena multidão ao desembarcadouro, pois não há nada que o brasileiro goste mais do que soltar uma bomba, busca-pé ou foguete, contentando-se também com ver os outros soltarem. Com efeito, que seria dos dias santos ali, se não houvesse a feliz invenção dos fogos?

(Thomas Bigg-Wither (1845-1890) era um engenheiro inglês; Seu relato parcialmente publicado aqui descreve sua estadia  em Antonina em 1872, como parte de um grupo que estava estudando o trajeto de uma grande ferrovia entre o Mato Grosso e o Paraná, então recém emancipado de São Paulo; trata-se de uma das mais completas e bem-humoradas descrições da Deitada-a-beira-do-mar no seculo XIX)

domingo, 13 de maio de 2012

CANELADAS....


MUNIRA PELUSO PROCESSA BLOGUEIRO

"copiei do Amigos do Jequiti'

Logo de cara coloco uma declaração do Ministro Ricardo Lewandowski sobre a liberdade de expressão:
“A Constituição Federal, nos artigos 5º, incisos IV e IX, e 220, garante o direito individual e coletivo à manifestação do pensamento, à expressão e à informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, independentemente de licença e a salvo de toda restrição ou censura" .
De antemão como não posso ser contra aos direitos constitucionais do cidadão, e aida conheço a honradez e a dignidade do amigo Paulo Cequinel, a ele presto minha solidariedade e apoio contra essa tentativa nefasta de cercear a livre manifestação.
"A ditadura não suporta a luz da democracia".
Abaixo publico a postagem do amigo Paulo sobre o episódio.


1. Munira "Mônica" Peluso está a processar-me por ter a ela me referido como Ficha Suja.


2. Ontem, por volta das 14:30 horas, recebi ordem judicial prolatada nos Autos 1843-30.2012, Comarca de Antonina, para remover postagens a ela relacionadas, uma de 17, outra de 19 e a terceira de 21 de abril, embora o mandado seja impreciso e genérico.

3. As postagens removidas, embora eu não as considere ofensivas coisa nenhuma, estarão "fora do ar", por assim dizer, e provisoriamente, porque ao final do processo provarei que não sou e nunca fui leviano e/ou mentiroso.

4. Reafirmo que a remoção relaciona-se ao cumprimento do mandado do MM Juiz de Direito da Comarca de Antonina, e não porque reconheça ou aceite que as postagens acima linkadas tenham atingido a honra da autora.

5. Permaneço e permanecerei em condições de andar por este mundo de cabeça completamente erguida e, muito especialmente, mantenho-me e manter-me-ei orgulhosamente capaz de encarar - olho no olho - meus filhos e meus netos. Eles sabem o pai e o avô que sou.

6. Lutarei o bom combate, como sempre fiz: brincaremos no regato, amanhecerá tomate, anoitecerá mamão.

7. Não me calarão! Mas nem fudendo!
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Em solidariedade ao amigo Paulo Cequinel que está sofrendo um processo da senhora Munira, a partir de agora este blog vai ficar “as moscas”.
Quem quiser se manifestar só precisará utilizar seu email e prestar seus comentários, sem moderação prévia do editor.
Essa medida coincide com a opinião de alguns comentaristas que propuseram a eliminação dos comentários anônimos, com o intuito de qualificar ainda mais este espaço, e também pelo email que recebi, no qual propõe a mesma medida e mais, que muita gente acessa e respeita o blog, mas não comenta por medo de ataques desrespeitosos dos anônimos (sic).
Portanto, meus caros, espero a compreensão de todos.
"Há pessoas que peferem a escuridão dos porões da ditatura a luz da democracia".

NE URUBLUES - Coloco-me totalmente solidário aos companheiros bloguistas, nessa tentativa de mordaça judicial imposta por políticos desesperados.

sábado, 12 de maio de 2012

QUE COMECE COM 'R"


Meu avô, Manoel Picanço (1904-1967) escrevia um diário, onde contava causos e anotava fatos do cotidiano de Antonina. Se tivesse conhecido a internet, "seu" Maneco com certeza seria blogueiro...
No dia 3 de maio de 1949, assisti na farmácia do Sr. Romildo Gonçalves Pereira, um caso interessante. Estava eu na farmácia acima quando chegou um caboclo e disse ao empregado do Sr. Romildo:
- O Senhor me venda uma pílula que comece com R...  
O funcionário deu uma risadinha e foi buscar a pílula.
Em julgando tratar-se de uma piada do caboclo, por tratar-se da farmácia do Romildo, cujo nome começa com R, me aproximei do mesmo e interroguei:
- qual o motivo do Senhor solicitar uma pílula que comece com R?
- É que a doença começa com R, é Reumatismo, respondeu o caboclo.

E o empregado lhe trouxe CafiAspirina. A conclusão foi que, Romildo Com R, Reumatismo com R e pílula com R, daria tudo certo. Mas o pobre levou CafiAspirina - na certa de que era com R.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

COMENTARISTAS ANÔNIMOS DA INTERNET

Essa saiu na Folha de São Paulo hoje...tudo a ver com a blogosfera do Reino?

quarta-feira, 9 de maio de 2012

EM DEFESA DE EDUARDO BÓ


Vivemos tempos extraordinários. A internet e as novas tecnologias da informação nos tornam mais conectados, numa proporção, desculpem a frase, nunca antes vista na história da humanidade. No entanto, importantes teóricos da rede são unânimes em apontar, em paralelo com os benefícios dessa interconectividade toda, a presença de alguns problemas graves. Um  deles, que gostaria de comentar aqui, diz respeito ao anonimato.
O anonimato está presentes na blogosfera capelista em grau muito intenso e importante. Um deles diz respeito às carradas de comentários anônimos que pululam na nossa comunidade. Em certo ponto, pode ser até bem vindo. É muito ruim quando isso toma o comportamento de turba. No entanto, o que não se pode mesmo  tolerar é a brincadeira  passar do ponto e descambar para a injúria, a difamação e a calúnia.
Vi, desde a semana passada, diversos comentários postados anonimamente em vários blogs importantes e respeitáveis da cidade questionando a prestação de contas do livro “Antonina – 35 anos de cumplicidade”, de nosso querido Eduardo Bó. Antes de tudo, quero dizer não tenho procuração para defendê-lo, embora me considere seu amigo. Nesta tarefa não estou sozinho, pois vários bloguistas já se manifestaram a respeito do assunto de maneira bastante contundente. Se também o faço, é porque vejo nessa atitude covarde de alguns uma tentativa de atingi-lo no que uma pessoa tem de mais sagrado, que é sua honra.
 Eduardo Bó pode ter todos os defeitos do mundo, mas é uma pessoa honrada. Poucas pessoas vivas fizeram tanto pela sua, pela nossa Antonina, mais do que ele. Seu trabalho como fotografo, bloguista e com idealizador do Festival de Inverno falam por si. Poucos bagrinhos são referência como Eduardo Bó. Prefeitos, vereadores, políticos, fofoqueiros de esquina passam. A obra de Eduardo, como representação do que é a Deitada-a-beira-do-mar nos últimos 40 anos, o seu incansável trabalho de documentarista de nossa cidade e de seus habitantes permanece. Essa é a importância de sua obra toda, a que vem se somar mais esse livro.
Um livro que não foi produto de um conchavo de bastidores, de negociata, mais foi sendo amorosamente gerado ano após ano, na avenida do samba, retratando o que ele, Eduardo, mais gosta de retratar – a gente de Antonina. Um livro esse que foi financiado por uma lei de fomento, qual o problema? Ao contrário dos artistas nacionalmente consagrados que alguns protestaram recentemente, Eduardo teve que ralar atrás de empresários o patrocínio a que tinha direito, um patrocínio, aliás, oriundo de renúncia fiscal do governo. Não é fácil para um artista, e ainda um artista bagrinho, vencer as resistências de empresa após empresa, até conseguir o total para financiar o livro. Eduardo lutou e conseguiu. Qual o problema com isso?
Eduardo Bó não é um homem rico. Tem suas posses, cuida de sua vida, paga seus impostos. Esse livro não vai fazê-lo mais rico. Sua riqueza vem de sua arte, do seu talento, uma coisa tão desproporcionalmente repartida que faz da pessoa talentosa um devedor nato. Sim, quem tem talento tem o dever de reparti-lo com todos os demais. E isso Eduardo vem fazendo com sua arte em doses generosas já lá se vai quase um vida inteira.
Qual seria o desígnio destas pessoas, acoitadas no mais vil anonimato, desmerecer, lançar duvidas ou tentar jogar lama no sucesso alheio? Meu amigo, vá trabalhar, vá fazer algo de útil para si, sua família ou sua cidade. É preciso acabar com essa autofagia perniciosa, que nos enterra politica e economicamente há quase meio século. É preciso circunscrever esses covardes no seu sujo covil, no antro de suas perversidades, ou eles tomam conta de tudo. Tomam conta da blogosfera, tomam conta da cidade e, pior, tomam conta de nossa alma, de nosso espírito. Como construir a cidade que todos queremos com o espírito roído por essa inveja mesquinha e imunda, por essa autofagia porca e rasteira?
Não foi pra isso que Valle Porto fundou essa cidade. 

domingo, 6 de maio de 2012

ANTONINA ANTIGA - VIII



Uma bela foto, mostrando a Praça Rio Branco, a atual Praça Romildo Gonçalves Pereira, lá pelos anos 20 do seculo passado. Segundo Ermelino de Leão, essa área era conhecida como “cais”, ou “aterrado”. Foi nessa área, próximo da antiga rua da praia, a atual Marquês do Herval, que deve ter-se iniciado o aterro da praça. Devia ser uma área de praia, isto é, com alguma areia; as ondas viriam bater ali nas pedras onde estão atualmente várias casas antigas e o restaurante Baía Bonita. A praia terminava na ponta da Califórnia, acidente geográfico desaparecido com a construção do armazém do Macedo, que hoje é o casarão em ruinas no fim da rua.
Quase todos os terrenos do lado do mar na rua Direita, a atual XV, chegavam até o mar. Não é de se espantar que fosse aí que se localizaram diversas empresas de exportação e importação, as quais construíram diversos trapiches que se podem ver em outras fotos. A atual praça deve ser do inicio do século XX, pois é citada por Ermelino em sua  obra “Antonina Factos e Homens”,  de 1918. O que se exportava então: nessa época, principalmente erva mate. Importava-se quase tudo.
A foto mostra as diversas casas ao redor da praça. Algumas bem grandes, como o casarão onde atualmente é a Associação dos Funcionários Públicos. Trata-se de um prédio grande, que rivaliza com os grandes casarões da rua Direita que podem ser vistos ao fundo da foto. Outra casa grande fica à esquerda na foto, onde se pode ler que a casa é a sede da firma Guimaraes e Cia. As restantes são casas pequenas, com duas ou três aguas. Das demais casas, somente uma apresenta platibanda, situada na parte esquerda da foto, com uma decoração de jarros.  
Além das casas, a natureza toma conta do resto: as três árvores na frente, as duas belíssimas palmeiras imperiais na parte esquerda e os morros do outro lado da baia compõe o cenário. Note-se que a praça é coberta de mato, e muito mato. Devia ser usada para os cavalos e burros do transporte de carga pastarem. Na rua, pode se ver aqui e ali algumas pessoas andando de paletó e chapéu e outras em manga de camisa trabalhando, provavelmente carregando alguma carga ou mercadoria.
Eu conheci essa praça com o nome de Feira-mar, pois o prefeito da época, em 1969, Romildo Gonçalves Pereira, colocou saibro e fez uma grande exposição feira de diversos produtos, a tal Feira-mar. Depois dele, nos tempos de Joubert Gonzaga Vieira, a praça virou praça e tomou o seu atual nome. Durante algum tempo, a praça da Feira-mar foi lugar dos namorados anônimos. “Foram pra Feira-mar!” e péquete! A guria ficava mal falada. Ser vista na Feira-mar de noite era uma temeridade. No entanto, era também uma possibilidade remota, dada a precariedade da iluminação de então.
Hoje, ela é a praça onde o pessoal vai tomar cerveja no fim de tarde, onde bate um vento bom vindo do mar. Nas festas, o pessoal deita ali de manhã e curte suas ressacas enquanto o sol não fica alto. E, também onde a turma do litro bate ponto, faça chuva ou faça sol, pra desespero das pessoas sérias. Bobagem. A turma do litro, na verdade, é a versão Cracolândia dos bagrinhos – você desmancha ela aqui, ela surge ali adiante, quase como se fosse possível apanhar o ar com as mãos. Quem já viu a cracolândia de São Paulo ou de outras grandes cidades sabe do que estou falando. Nem sei qual seria o problema ou a solução, mas repressão pura e simples realmente não funciona.
Enquanto isso, o velho Aterrado segue cheio de histórias pra contar.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

A NOVA ANTONINA

o Farol da Ilha do Mel em 2062, submerso por causa do aquecimento global


Estamos no ano de 2062.  Com o aquecimento global, o nível dos oceanos subiu três metros em todo o planeta. Com isso, amplos trechos da cidade ficaram submersos. Sobrou a colina da matriz, transformada de novo em ilhazinha batida pelas ondas, e o morro do Bom Brinquedo, que virou ilha do Bom Brinquedo. Os bairros ficam isolados, as pessoas não têm como se mover, não há barcos pra todos. O caos se instala. Não há alternativa, pensam os habitantes, a cidade vai ter que se mudar. Pra onde?
Existe um lugar, apontam os técnicos do governo do estado, é a região de São Joãozinho Feliz. Lá deve se localizar a Nova Antonina, distante da velha Antonina tão cheia de pecados e agora tragada pelas aguas do aquecimento global, como foi previsto pelos profetas do inicio do século XXI. É uma nova oportunidade de zerar tudo e começar de novo, sem os erros do passado.
 Ótimo, diz a prefeita da época, vamos desapropriar essa área e vamos construir a nova cidade. Todos ficam felizes com sua determinação. O Governador vai até lá de helicóptero, abraça e beija as criancinhas e diz que vai mandar dinheiro. O Ministro também prometeu liberar as burras da administração federal pra salvar a cidade submersa.
Mas, há empecilhos: alguns proprietários querem se livrar logo de suas terras, outros elevam o preço até as alturas. O dinheiro não chega, não chega, e, quando chega, é um terço do dinheiro inicialmente previsto. Há que se fazer licitações para construção das ruas e das casas. As licitações são lentas, pois desde o inicio do século pioraram muito as leis de licitação para evitar a corrupção politica. Somente empresas marcianas de ilibada reputação se candidatam.
Onde vão ser as casas? Quem vai ter acesso a elas?  Nesse momento, a elite da cidade, que ninguém achava que existia, toma a frente e requer os melhores lugares. Depois, a classe média e, por fim, o povão ocupa o que sobrou, ou seja, alto de morro, beira de rio, locais de mangue. O terreno todo é ocupado, alguns proprietários são indenizados, de preferencia os amigos da prefeita ou do deputado amigo da prefeita. Os outros que se virem. A oposição reclama, os blogs reclamam, mas a caravana passa. A nova Antonina inicia as obras de sua refundação.
Quando os operários executam a primeira sondagem, um cheiro ruim invade a área. Mulheres desmaiam, crianças choram, e um cheiro de ovo podre toma conta do ar. Um velhinho bem velhinho se lembra de que era ali, naquele lugar, que no século XX e começo do XXI onde os capelistas jogavam seu lixo. O terreno mole começa a afundar, engolindo a super-escavadeira recém-comprada pela prefeitura, tragada pelo solo colapsível do lixão, ops! Aterro Sanitário.
Em meio ao caos que se forma, alguém pergunta pra prefeita o que fazer. Atarantada, como todos por ali, a alcaidessa olha em redor e grita: “vamos pra Morretes! Eu já moro lá e é pra lá que nós vamos!” A multidão começa a pegar suas tralhas e uma longa peregrinação começa pela estrada do Sapitanduva em direção à terra de Rocha Pombo. Os anônimos dos blogs não vão ter mais do que reclamar, pois alcançamos finalmente Morretes, a perfeição na Terra. Lá não jorra leite e mel, mas é mais limpinha, organizada e tem emprego nos restaurantes. Que não haja medo do futuro nem saudade do passado: ao virar a última curva, onde ainda se avistam as ruínas de uma antiga cidade deitada embaixo do mar, que ninguém olhe para trás, por via das dúvidas. 

quarta-feira, 2 de maio de 2012

UMA PAISAGEM SUIÇA

Karl Von Koseritz, jornalista teuto-gaúcho, foi um importante jornalista do periodo imperial; essa é a primeira visita que nos fez, em abril de 1883. 
Karl Von Koseritz (1830-1890)


Cerca de 10 horas e surgiu à vista a pequena cidade de Antonina. Como num cenário levantavam-se dos dois lados, principalmente do direito, as cadeias de montanhas e a vista é das mais imponentes que já conheci, absolutamente uma paisagem suíça. Assim como a estrada do Paraná é absolutamente uma estrada suíça. Eram 10 horas e nós estávamos justamente sentados para almoçar, quando a ancora caiu no belo porto de Antonina que é livre de qualquer obstáculo.
 Se eu não soubesse que o Brasil é incompreensível eu acharia estranho que a estrada não tivesse partido de Antonina, em vez de Paranaguá, para Morretes e etc. em todo caso Antonina é a localidade de maior futuro e só a falta de estrada de ferro poderá deixá-la para trás. A competição que existe entre Antonina e Paranaguá é semelhante à que existe entre Pelotas e Rio Grande. Para Paranaguá – como para Rio Grande – foi levada uma absurda estrada de ferro, e Antonina se queixa,- como Pelotas, - do fato de não possuir uma alfândega. Sempre há aqui uma diferença: Pelotas ganhou aos senhores de Rio Grande uma mesa de rendas alfandegada. Desci em Antonina com o amigo Rosch, que tinha um conhecimento da terra igual ao que já demonstrara sobre a estrada do Paraná. Antonina tem um bonito cais e é uma gentil cidadezinha, não completamente limpa, mas, em todo caso, mais limpa do que Porto Alegre. O pior estado sanitário é devido à extraordinária extensão das marés; a maré baixa deixa muitas quadras cobertas de lama. Sobre a qual queima um forte sol; está claro que aí não deverão faltar os miasmas. 
Coisa inesperada para mim foi a existência de ruínas quase românticas, velhos panos de muro cobertos pela vegetação, que devem restar do tempo das primeiras habitações. Grandes quantidades de urubus pousavam sobre quase todos os tetos ou passeavam nas ruas, como, entre nós, as pombas. Logo chegamos à hospedaria da velha Rosskamm, aquela casa que todos os alemães do Paraná conhecem. Lá nos deliciamos com a excelente cerveja nacional de Morretes, que o amigo Rosch pretende ser o único preservativo contra a febre palustre, e estivemos em animada conversação com os outros passageiros desembarcados. 
Eu esperava atravessar Antonina incógnito, mas não pôde ser, porque apenas a velha Sra. Rosskamm ouviu o meu nome na nossa conversa, dirigiu-se a mim perguntando: “o senhor é o Koseritz, cujo calendário e cujo jornal possuo?”. O incógnito tinha ido por água abaixo e não seria utilizado mais tarde,pois pouco depois, quando passeávamos pela calçada irregular, entre ruínas e urubus, aproximou-se um dos sólidos carros que viajavam até Curitiba e desde longe, de dentro dele, o coronel Schuster-Schutz lançou-me um cordial “seja bem-vindo”. Voltamos com ele à casa da Sra. Rosskamm e passei uma hora com o velho e caro amigo, que se tinha curado de uma febre de 13 meses, contraída na colocação de telégrafos no Paraná. Schuster-Schutz envelheceu, mas conserva fiel sua raça de outros tempos e é sem duvida um homem que prestou ao Brasil os maiores serviços. Ele colocou quase toda a rede telegráfica do império. Pelas 4 horas nos despedimos da sra. Rosskamm e regressamos para bordo. 
Na volta pela praia vimos uma coisa extraordinária: quatro gigantescas rodas que um talentoso engenheiro fez construir há tempos para, com seu auxílio, conseguir transporte através da serra! Lá estão elas, apoiadas numa ruína, antigo e triste testemunho da insensatez dos homens, que a tornou inúteis e vencidas. As rodas gigantes são sem duvida a coisa mais notável de Antonina. 
Quando chegamos a bordo o exército vitorioso já tinha embarcado, com exceção do comandante e seu estado maior. Mas lá vêm eles, numa barca militar embandeirada, com enormes bouquets de flores nas direitas possantes, e com flores em todas as casas de botões. Como se vê, Antonina honrou os “bravos vencedores” de Curitiba. Assim que o leal Eneias chegou a bordo com seu estado maior, largamos e breve estávamos de novo diante de Paranaguá, onde recebi a comunicação telegráfica de que o ministro Ávila nos aguardava desde o dia anterior em Santos. Chegou-nos, por cima, a bordo, ainda uma companhia de artistas cavaleiros, com seus cavalos magros e não menos magras raparigas e, ao cair da tarde, passamos, repletos, pela barra de Paranaguá, diante da alta ilha e do belo farol, com a agradável certeza de termos a bordo pelo menos 600 passageiros.

Bordo do “Rio de Janeiro”, 16 de abril de 1883.