A pracinha de Ribeira (SP), em dezembro de 2018...como ela era em dezembro de 1941, quando os escoteiros de Antonina passaram por ali? |
Os escoteiros acordaram cedo naquela véspera de Natal. Era o Natal de 1941. Um natal triste para muita gente em muitos lugares do planeta. A
guerra seguia feroz na Europa.
Os soviéticos lutavam desesperadamente para manter Moscou e Leningrado,
ameaçadas pelas tropas Nazistas. Na África, a luta era por Bengazi, na Líbia. No
entanto, era na Ásia que a guerra estava mais violenta. Os americanos estavam sendo derrotados nas Filipinas e os ingleses lutavam desesperadamente para manter Hong
Kong frente ao avanço japonês.
Por outro lado, os meninos deixaram Epitácio Pessoa as 7 horas da manhã,
agradecendo o pouso e a boa acolhida na vila. Agora desciam a estrada margeando
o rio Grande rumo à Barra Grande, onde encontrariam o majestoso rio Ribeira de
Iguape. Dali, era só seguir para Adrianópolis e cruzar a ponte que já estariam
em São Paulo, etapa seguinte da marcha.
No caminho Lídio notou maravilhado os inúmeros monjolos que
iam encontrando no caminho. Anotou que estes moinhos rústicos eram muito uteis
naquelas paragens distantes, onde não havia energia elétrica ainda. E notava o
movimento do soque com uma certa nostalgia: “um sobe e desce sem parar, um barulho
gostoso de se ouvir”.
Os meninos chegaram na localidade de Descampado ao final da
manhã. Lá, tiveram um contratempo, pois ninguém ali quis vender comida para
eles. Nem um pãozinho. Fosse porque não tinham, fosse porque não queriam vender
nada aos forasteiros, os rapazes tiveram que se contentar em comer biju com
chimarrão.
Lídio anotou que, apesar de "desnutridos", os rapazes continuaram a
caminhada sem queixas ou lamentações. Segundo ele, haviam perdido 6 quilos cada
um nesta primeira etapa da viagem. E a tendência era perder ainda mais, anotava.
A viagem pela “estrada provisória” seguiu até Barra Grande,
onde encontraram o Ribeira. Em dezembro, o rio estava barrento por causa da
estação das chuvas. Somente algumas pedras eram visíveis ao longo do rio.
Cercado por morros bastante íngremes e com uma vegetação em diferentes
tons de verde, os rapazes finalmente avistaram a rodovia federal, que chegava
até Paranaí, a atual Adrianópolis. Antes de cruzar a ponte de concreto que
ligava Adrianópolis a Capela da Ribeira – hoje o município paulista de Ribeira –
os rapazes tomaram um chimarrão com os fiscais estaduais e federais no lado
paranaense da ponte. E só depois cruzaram o rio.
A ponte sobre o Ribeira é uma luta eterna das duas
comunidades, Ribeira e Adrianópolis. Esta que os meninos cruzaram foi a primeira ponte de concreto. O rio
Ribeira, cheio de energia, não está nem aí para as pontes, e já derrubou todas
elas. A atual ponte de concreto, a mais alta e reforçada de todas, foi construída
em 1998-99, depois de ter sido destruída por uma forte cheia.
No lado paranaense, Lídio anotou, cheio de certa nostalgia,
que havia do lado paranaense um grande outdoor onde estava escrito: “Paraná, Terra dos Pinheirais”.
Ao fim da tarde, na cidade de Capela da Ribeira, os rapazes procuraram
as autoridades locais. Encontraram o Secretário da Prefeitura. Este avisou que
ali não havia pensão suficiente para abriga-los todos, e o prefeito estava
viajando. No entanto, o secretario lhes ofereceu sua própria casa.
Depois de tomar banho no rio Ribeira e colocarem os uniformes “de
gala”, os meninos foram para a praça principal, onde fizeram uma rápida reunião.
Nesta reunião eles decidiram os próximos passos rumo a capital São Paulo, próxima
etapa da viagem. E decidiram enviar um
telegrama para Antonina, para avisar que estavam todos bem.
Qual não foi o espanto dos rapazes ao descobrir que haviam
dois telegramas esperando por eles, datados de dois dias antes: um da
prefeitura municipal, avisando da presença dos escoteiros por ali. O outro
telegrama era do chefe Picanço, pedindo para que o Chefe Beto entrasse em
contato com ele, pois todos estavam ansiosos por notícias. Era o primeiro
contato que tiveram desde que haviam saído de Antonina, oito dias antes.
Os escoteiros mandaram orgulhosos um telegrama: “Capella da Ribeira 24 dezembro 1941: chegamos
hoje bons vencemos primeira etapa continuamos amanhã noite – Sempre Alerta!
Beto Milton Lidio Manoel Antonio”.
Os rapazes ainda cheios de energia alugaram umas bicicletas
e foram passear, menos o chefe beto e Canário, que ficaram no banco da praça
descansando. Lídio ainda teve tempo de mandar cartas para a família e amigos. Também
foi à alfaiataria do Elpidio. Lídio ainda mandou costurar suas calças descosturadas
na entreperna, além de consertar um sem-número de botões da roupa dos demais.
Houve um apagão de energia elétrica, que durou até as nove
da noite. A energia vinha de Apiaí, e demorou a ser reparada. Que inconveniente
conveniente! Enquanto isso, os rapazes ficaram na praça escura e até arrumaram
umas namoradas.
Depois, à meia noite, os rapazes assistiram a missa do Galo
em Capela da Ribeira, ministrada pelo padre de Apiaí. Lídio aproveitou seu
curriculum de coroinha e ajudou o padre, junto com uma menina que era Filha de
Maria. Foi um comentário só na igreja: um coroinha vestido de escoteiro!
Depois, os rapazes participaram da ceia na casa do
secretario municipal, onde estavam alojados. Foram servidas gasosa, soda
limonada e vinho, além de um grande bolo com motivos natalinos.
Já era quase duas da manhã quando todos, exaustos, foram
dormir.
Dingobells!
A saga desses escoteiros antoninenses será sempre uma fonte inesgotável de perseverança. Parabéns pelo texto, caro Jeff!
ResponderExcluirMuito obrigado, Edson!! Sim, esta viagem é uma fonte inesgotável de tudo...
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