domingo, 9 de junho de 2019

CORRER EM AEROPORTO - Diários (norte)americanos, 2 (a missão)



Odeio correr em aeroporto. Detesto. Convenhamos, não é o melhor lugar pra correr. Está mais para o estresse que para a saúde. Correr no aeroporto é correr num lugar cheio de gente, cheio de pisos diferentes, escadas, escadas rolantes, um infindável número de quiosques de coisas no seu caminho. E temos que correr.
Em geral, não é uma corrida simples. Além de ser uma corrida de obstáculos, você ainda está carregando alguma coisa. Uma mala, uma mochila, um pacote com o presente que você comprou para alguém querido, suas blusas de lã...a lista é infindável.
Já fui bom de corrida. Tive tempos memoráveis antes de meus joelhos me traírem. Hoje, correr é praticamente só no aeroporto. E eu detesto. Correr contra todos os que estão no seu caminho, tenham eles culpa ou não de estar na sua frente. Nunca tem nem nunca terão culpa, exceto os distraídos crônicos, dentre os quais me incluo. Correr contra o tempo, correr para pegar um check in aberto, correr para não perder o voo. Correr pra alguma coisa que vai acontecer e você não tem tempo.
Ontem, quando entrei nos Estados Unidos, entrei por Dallas. Passei por toda a parafernália da imigração. As entrevistas até nem são muito complicadas, e o pessoal se mostrou atencioso. O problema é passar pelos tais detectores. Tive que, como todos, tirar os sapatos, os cintos, estripar a mochila e abrir tudo. Esvaziar os bolsos, colocar tudo para fora.
Dentro daquele escâner de gente, é você praticamente como veio ao mundo, tirando algumas roupas por cima. Fiquei com medo. E se o escâner mostrasse quem eu sou? Quem eu realmente sou? Anos e anos de análise e terapia (freudiana e lacaniana), de meditações, de conversas profundas e discussões de relacionamento – vou encontrar quem eu sou no escâner de um aeroporto no Texas? Bizarro.
Depois, de passar pelo escâner, tive que correr. Fiz de tudo para não correr, mas meu voo estava ora num canto ora no outro, e fiquei perdido entre os balcões de embarque. Quando eu achei, foi depois de uma maratona e uma meia maratona e mais o complemento de uns 100 metros rasos com um “peixinho” na chegada. No entanto, apesar de todo este esforço, perdi meu voo.
A funcionária do balcão da companhia aérea não deu muita bola para meu sofrimento. Não teve qualquer pressa em fazer suas funções. Cada coisa a seu tempo, “no rush”. Entretanto, apesar de sua cara de poucos amigos, Cindi (era o nome no crachá) me deu uma outra possibilidade. Um voo no outro terminal. Outra viagem dentro do aeroporto. Trem, escadas rolantes, corredores imensos e vazios. Aqui estou. Espero nunca mais correr em aeroportos.
Estou aqui, em outro guichê, em outra espera, cheio de gente ansiosa ao meu redor. Eu tento esconder minha ansiedade. Mas estou ansioso. Será que vou conseguir embarcar? Será que vou ficar por aqui pra sempre, como aquele filme do Tom Hanks? Menos, Jeffinho, menos...
Só fico pensando na minha mala, que já despachei...será que um dia vamos nos encontrar?

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