"Nossa primeira raiz, a mais funda, vem do garoto
alegre correndo com seus amigos ou maltratado em casa; da menina que se sentia
amada ou brutalizada, quem sabe ridicularizada. Até o fim guerreamos com
aquelas arcaicas realidades ou fantasmas: anistiar uma infância difícil é
trabalho de guerreiros, e guerrear é parte do destino humano. " Lya Luft
Meu pai faria hoje 75 anos. Como não lembrar o 7 de janeiro,
eu, que sempre fazia as minhas contas pra sempre passar em Antonina nesse dia
pra vê-lo, dar um abraço e seguir adiante.
Eu sempre conheci meu pai enorme, um gigante quase. Difícil
não gostar daquele homem enorme, que quase sem esforço nos tirava do chão e nos
erguia até as alturas. Que sempre me trazia algo, nem que fosse um apertado
abraço. Que me deu minha primeira bandeira do Atlético, mesmo sendo ele
torcedor do Ferroviário (ou Colorado, ou Paraná, ou...). Que me levou a
Curitiba, ver os animais do Passeio Público. Amei-o com aquele amor que os
meninos sentem por alguém que pode, por qualquer coisa, por uma caixa de
ferramentas fora do lugar, tornar-se trovejante e colérico. Que se torna chato
quando nos impõe tarefas de casa, quando impõe sua lei.
Eram tantas as suas leis que a gente não se dava conta que
aquele homem imenso era na verdade um menino. Um grande menino, com os mesmos
medos e angustias que nós tínhamos. Que jogou bola, que tomou sorvete do
restaurante Marreiro, que brincou na caserna, que matou aula (ora se viu?), que
amou seu pai, meu avô, com o mesmo amor fervoroso e desconfiado que nós um dia
viríamos a sentir por ele. Que, às vezes, não entendia direito as leis que nos
impunha. Que tinha os seus problemas, as suas neuras, os seus pecados, reais ou
inventados. Que tentava entender os "tempos novos", que sabia
desconstruir e construir. Enfim, um homem-menino absolutamente moderno.
Mas são coisas que a gente só entende tarde na vida, ou
quando se é pai. Ao ver meus sentimentos para com meus filhos eu me vi nas
mesmas duvidas e angustias que meu pai teve. Cometi erros, tive acertos, como
todos. Mas tive muita sorte, principalmente muita sorte. Tive sempre ao meu
lado, quando precisei, aquele menino magrinho criado na rua do campo, o Dodô de
seu Manequinho, a me ensinar seus erros e acertos. Pois que o menino é o pai do
homem.
(um texto de 2009, primeiro aniversário de seu falecimento; algumas feridas cicatrizaram, outras nunca vão, assim são as coisas. Saudades de seu Dodô, que hoje faria 79 anos)
Belo texto, querido amigo.
ResponderExcluirTeve um dia, talvez há uns 15 anos, que dei-me conta do quanto eu parecia com meu pai, muito especialmente no jeitão de amar e de criar meus filhos.
Como meu pai criou 7 filhos, muito bem criados mesmo sem nenhum manual de instruções, senti-me feliz com a descoberta.
Tenho orgulho de parecer-me com meu pai.
Meu caro
ResponderExcluirobrigado por suas palavras.
O fato é que amor é amor de qualquer jeito, mesmo de um amor meio sem jeito. Quando me dei conta que criava meus filhos tendo meu pai como modelo - e não os livros e outras coisas do gênero, besta moderninho que sou - tudo começou a fazer mais sentido.
Hoje tenho dois filhos, dois enteados e quatro pessoas que eu curto muito.
Abraços