sábado, 26 de maio de 2012
quarta-feira, 23 de maio de 2012
O LIVRO DE THIAGO
o poeta antoninense Thiago Peixoto (1876-1921) |
Há cerca de um mês atrás, apareceu no Bacucu com Farinha um
poema atribuído a Thiago Peixoto, o maior poeta antoninense de todos os tempos.
Na sequência, algumas postagens denotaram que o poeta e sua obra estavam
esquecidos da maioria das pessoas da cidade onde nasceu, e onde é nome de uma
das principais avenidas de Antonina.
Pesquisei também o pouco que se sabe da vida de Thiago Peixoto.
Pelo que vi, só existe um livro, o “Livro de Thiago Peixoto”, publicado por
seus amigos Otavio Secundino e Bertier Oliveira em 1922, pouco após sua morte. Foi
um tributo de amigos. Ali, além dos poemas de Thiago publicados esparsamente,
haviam diversos necrológios escritos por um grande numero de amigos, desde Ermelino
de Leão até Leôncio Corrêa. Pelo que se pode perceber, o livro foi publicado aparentemente
à revelia de sua família, que segundo Otavio Secundino não forneceu nenhum
detalhe ou poema para os editores. Mesmo a foto que consta no livro foi obtida
por intermédio de terceiros.
Pelas parcas informações que levantamos sabemos que Thiago Peixoto,
autor do belo soneto Saivá, nasceu em 1º de março de 1876 em Antonina. Aí fez seus
primeiros estudos. Jovem, em Curitiba, escreveu
diversos poemas publicados nas diversas revistas simbolistas que apareceram na
capital paranaense no inicio do século XX. Tendo feito muito sucesso, no
entanto retornou à capela, casou-se com D. Adília Peixoto e com ela teve 7
filhos. Pelo que se pode entender dos dados dispersos pelo livro, nesse seu
retorno Thiago foi guarda-livros, participou do governo municipal e foi diretor
do extinto Instituto Comercial de Antonina. Depois de longa doença (qual
seria?) acabou por falecer triste e amargurado na Deitada-a-beira-do-mar em 23
de maio de 1921, há exatos 91 anos.
Não sei da autenticidade do poema que circulou na rede. Ele,
pelo menos, não consta dos tantos que estão no Livro de Thiago Peixoto. De toda
forma, é melhor que as trovas apócrifas de Bento Cego que andaram vagando pela
blogosfera recentemente. Seria interessante ver outros poemas de Thiago, além dos
que estão publicados no livro citado.
É desperdício de bits reclamar de nossa memória histórica,
quase a vaga lembrança da piada do português. Em vez disso, um anônimo muito
inspirado propôs, também aqui no Bacucu, de uma verdadeira plataforma para a
cultura, já que estamos em ano de eleição municipal. Entre outras coisas, o tal
anônimo listou a reformulação da Biblioteca Municipal e a criação de um Museu
Histórico, através de uma politica de preservação de documentos, fotos, mídias e
objetos antigos. Da mesma forma, propõe a criação de um Arquivo Histórico Da
Cidade. Este arquivo histórico, em minha opinião, deveria reunir documentos
antigos e preservá-los, na forma de transcrições e coisas do gênero. Curitiba,
com Romário Martins, fez isso em 1920, com a publicação de todos os arquivos da
Câmara Municipal desde os primeiros tempos em 1693 até a República. O resgate
de nossa memoria histórica, a par do tombamento que está sendo feito pelo IPHAN
faria Antonina ter memória e, portanto, também história. Alguém se candidata?
sábado, 19 de maio de 2012
COMEÇA O INFERNO DA SEGUNDONA
Virgilio e Dante dando uma olhada na primeira rodada da segundona |
Começou o Campeonato Brasileiro que vale alguma coisa, o
Brasileiro da série B; vale, no mínimo, uma passagem para o titulo
intercontinental do Atlético em 2014, segundo ouvi do falecido presidente Rubens Passerino Moura,
especial para o Pai Zinho News. Será?
Estou aqui acompanhando, com meu amigo Gusano, o até agora primeiro
tempo em Joinville: até agora 2 a zero pro furacão, com gols de Manoel e Bruno
Mineiro, depois de dois alçamentos de bola (que bonito!) de nosso ex-jogador em
atividade, o eterno Paulo Baier. Gusano está ansioso, pois seu time o Pumas, deve
jogar hoje as 18h (21h de Brasília), contra o Chiapas pelo campeonato mexicano.
Tá mal o Pumas, terminou o apertura em 13º lugar.
Vários amigos especiais acompanham o rubro negro em sua
temporada no inferno: Arthur Rimbaud, jovem centroavante do Lille, da França, além
dos dois titulares, Dante Alighieri e o poeta Romano Virgílio. Dante está meio
chateado, pois sua Fiorentina terminou o campeonato da bota em 10º, com 40 pontos.
Já Virgílio sofreu com a sua Roma, que ficou em sétimo e ainda viu o rival
Lazio conseguir vaga para as copas europeias. Acontece.
O Joinville diminui, gol de pênalti. Mas que merda!! Virgílio,
andando por entre as almas penadas do inferno, faz uma cara de “eu já sabia”. Mas
Dante Alighieri diz que Paulo Baier está jogando muito. E GOL!! Mais um passe
de Paulo Baier! Fernandão! Uhu! Gusano me olha com uma cara de verme, enquanto Rimbaud
dá uma risada amarela e toma mais uma dose de absinto. E daqui a pouco o
quarto! Renan Teixeira, aos 39’, amplia
para o rubro negro!!4x1!!
Um primeiro passo. Pra quem terminou seu último brasileiro na rabeira, não custa terminar a primeira rodada em segundo, pois o América
de Natal ganhou de 5X2 do Goiás, jogando
em casa. Nada ainda decidido no campeonato, Rimbaud saiu à francesa pra ver um show da Virada
Cultural aqui em Campinas. Estou aqui
com Dante e Virgílio tomando uma loira gelada pra comemorar a estreia do Furacão
na segundona. Maravilha. O bom do inferno é você tentar sair dele. Enquanto isso
Gusano está grudado na internet: daqui a
pouco começa o jogo do Pumas. Sabadão esportivo é isso aí.
sexta-feira, 18 de maio de 2012
O QUE SABEMOS DE BENTO CEGO?
O jornalista antoninense Nestor de Castro (1867-1906), em óleo de Alfredo Andersen. |
Nesses árduos tempos de blogosfera, alguém andou perguntando
de Bento Cego, e o que se pode fazer para recuperar sua memória. A memória de Bento
Cego eu não sei, mas sei quem é o responsável pelo fato dela – mesmo incompleta
– estar acessível para nós, pessoas do século XXI: trata-se de Nestor de Castro.
Por uma feliz coincidência, hoje, 18 de maio, faz exatos 145
anos que nasceu Nestor de Castro, um dos maiores jornalistas do Paraná. Nestor de
Castro nasceu na Deitada-a-beira-do-mar no ano de 1867, filho de Felipe de Castro
e Ana Pereira de Castro. Nestor de Castro teve uma infância difícil – aos 4
anos de idade perdeu a mãe; aos 9 ficou órfão de pai. Em Antonina estudou com o professor Manuel Libânio
de Souza, com quem aprendeu as primeiras letras. Com dez anos, foi enviado ao
seminário em São Paulo. Ali, foi protegido pelo influente cônego Manoel Vicente,
capelista como ele.
Ao retornar a Antonina, em 1886, tentou a vida no comércio,
mas não teve sorte. No ano seguinte, casou-se com Arminda Pinheira da Costa,
mudou-se para Curitiba e iniciou-se no jornalismo. Trabalhou no jornal Dezenove
de Dezembro, ligado ao Partido Liberal, logo se destacando com um ardente
polemista. Foi muito amigo de Teófilo Soares Gomes, pai de Heitor Soares Gomes,
o melhor prefeito de Antonina no século XX. Chegou a escrever peças de teatro,
em parceria com Jaime Balão, musicadas por Augusto Stresser.
Durante a Revolução Federalista, como todos os liberais de
seu tempo, participou do governo revolucionário em 1894 como secretário de
estado. Com a derrota do movimento, foi obrigado a exilar-se. Nos campos do
sul, ouviu muitas trovas de um cantador chamado Bento Cego, capelista como ele,
e se interessou pela vida do poeta popular.
De volta a Curitiba, foi duramente perseguido pelo
situacionismo governista. Passou, com sua mulher e seus 12 filhos, por grandes
necessidades. Somente em 1902, por iniciativa de seu amigo Teófilo Soares Gomes,
foi que Nestor de Castro foi convidado pelo governador Vicente Machado para
trabalhar no jornal “A República”, de situação. Tratava-se do mesmo jornal que
ele tanto havia combatido no passado.
Neste curto período, escreveu sua monografia sobre Bento
Cego, provavelmente sua obra prima. Nestor de Castro juntou no texto as
escassas informações que obtivera no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo
e Minas Gerais, bem como cartas do cônego Manoel Vicente, que também pesquisou
a vida do cantador do Registro. Ermelino de leão somente reproduziu o que Nestor
de Castro encontrou.
Nestor de Castro faleceu subitamente aos 39 anos de idade,
em 14 de agosto de 1906. Hoje, reconhecido por sua obra literária e jornalística,
Nestor de Castro é nome de rua em Curitiba e é o patrono da cadeira de numero
33 da Academia Paranaense de Letras. Na sua cidade, como de praxe, pouco se
sabe de um ardoroso e combativo jornalista, que um dia foi reconhecido,
juntamente com Romário Martins, como um dos maiores jornalistas do Paraná.
Fonte: Samuel César, “O elogio do Patrono”, discurso na Academia
de Letras do Paraná em 21 de janeiro de 1927; publicado em “Obras de Nestor de Castro”.
Curitiba, Editora GERPA, 1945.
quinta-feira, 17 de maio de 2012
CARTA ABERTA À NAPOLEÃO PELUSO JUNIOR
Caro Napoleão Júnior:
Confesso que ao chegar cansado em
casa, depois de enfrentar meus alunos o dia inteiro, fiquei meio chateado ao
encontrar seu “tijolo” de texto em meu blog. Como faço nessas horas, fui
conversar com Gusano. Gusano, se você não conhece, é meu amigo engarrafado, o
verme da garrafa de mezcal que trouxe recentemente do México. Gusano, o verme
certo das horas incertas, me fez ver que, ao contrário do antagonismo que
supomos existir, temos algumas coisas em comum. “Mas vocês não moraram na mesma
rua?”, me perguntou Gusano com sua dialética de verme. Pois então.
Eu cresci, assim como você, na Rua
Coronel Líbero, em minha opinião a melhor rua deste lado da Via Láctea. Ali,
caro Napoleão, entre os dois postes do atual Teatro, antigo Cinema, aconteceram
algumas das mais memoráveis partidas de futebol de minha vida. Em frente à atual
casa de sua mãe, que foi durante muito tempo vizinha de minha casa, antes de
você morar ali, teve muito futebol rolando, da melhor e da pior qualidade. Chegou a ter jogo de dez contra dez, e isso num tempo em que o tráfego de veículos era pelo menos o dobro do de hoje!
Se você tivesse morado ali
naquele tempo, nos anos 70 e 80, poderíamos ter nos conhecido jogando bola, ou
andando de bicicleta. Ou, então, brincando de mãe-baleia, que pegava de um
ponto a outro da calçada. Quem atravessasse tinha que correr pra não ser pego.
Se você fosse mais grandinho, podia ter brincado de polícia e ladrão, que em
algumas versões abrangia toda a cidade, da Rua do Esteiro (sabe onde fica?) até
o morro do Joubert, hoje velhinho (90 e poucos anos!) e reverenciado por todos
como um grande prefeito do passado. Era muito divertido aquilo tudo.
Pois então. Por conselho de Gusano,
nem li seu “tijolão”. Se você acompanhou algumas polêmicas aqui no meu blog ou
no Bacucu com Farinha, onde o Neutinho gentilmente me cede o espaço, teria percebido
que não sou uma pessoa boa, nem mesmo virtuosa. Por dentro, sou mau, muito mau.
Egocêntrico, corrupto, devasso, perverso. Algaravias, garatujas e heresias,
esse é subtítulo do meu blog e o meu subtítulo. Por isso mesmo, se eu procuro
andar certo na vida, é porque quero distância de policiais e advogados. Não entendo
nem quero entender de leis, e por isso mesmo procuro segui-las como um bom
cidadão.
Desta forma, pela amizade que
decerto teríamos se tivéssemos nos conhecido em nossa infância/adolescência na Rua
Coronel Líbero, eu gostaria de te dar um conselho. Eu sei, conselhos, se bons
fossem, não seriam dados e sim vendidos. No entanto eu te peço: largue a barra
da saia e venha fazer parte de nossa turma. Faça um blog e vamos discutir. Aqui,
na blogosfera dos bagrinhos, a gente faz como fazia antigamente na boa e velha Coronel
Líbero: às vezes, damos umas caneladas uns nos outros, discutimos, brigamos. Mas
sempre resolvemos as coisas entre nós. Levar as coisas para uma instância
superior, como reclamar pro pai ou pra mãe – ou pro juiz – não resolve nada e
deixa o cara marcado na turma – “aquele é o guri que foi chorar pitanga”. Acho que
você, valente como se mostra, não quer correr esse risco, não é?
Bom advogado, você até pode
ganhar a ação de calúnia que você move contra o Cequinel, esse nosso boquirroto
amigo, sempre direto e sem papas na língua, mas com um coração enorme. Você ganha
na Justiça. Mas em médio prazo politicamente você perde, e isso até Bento Cego já
percebeu. Retire a ação contra o Cequinel e vamos discutir politicamente a
candidatura de sua mãe. Você é inteligente e tem coragem, já demostrou isso. Se ela for absolvida, concorrer e o povo votar
nela, assim é a democracia, e eu me curvo à vontade popular. Mas, por favor, pare
de fazer biquinho, porque isso é chato, assim como o tal “tijolão” cheio de
leis e quetais que você postou no meu blog. Assim vamos brincar de verdade, num
jogo que Antonina e seu povo tem muito mais a ganhar que essas nossas picuinhas
de blogosfera.
CONTRA A HOMOFOBIA
Apoio a luta contra qualquer tipo de discriminação por motivos de raça, cor, religião, crença politica, opção sexual e outras discriminações; só evoluimos enquanto sociedade quando paramos de nos matar por causa destas bobagens, sob o amparo de um estado laico. Essa postagem eu dedico a Alan, grande carnavalesco da Deitada-a-beira-do-mar, e que morreu de AIDS nos anos 90 no hospital Silvio Linhares sem qualquer tipo de ajuda por causa do medo - e da falta de informação - que todos, inclusive o pessoal de saúde - sentiam da doença.
quarta-feira, 16 de maio de 2012
UM VISITANTE ILUSTRE
Neste último domingo, estava
fazendo uns serviços em casa. Temos uma amoreira que está grande, e nesta época
ela suja a calçada com seus frutos e nos dá um trabalho danado de limpá-la. Eis
que toca o telefone. Vou lá correndo atender: do outro lado, escuto a voz de
meu guia espiritual, pai Zinho de Obatalá. Sim, tenho um guia espiritual, o
qual, apesar de entendido na metafísica do além, é ainda altamente tecnológico:
“liga o Skype!”, me pede ele.
Fui até o escritório, liguei o
computador no Skype e nos falamos um pouco. Pai Zinho me avisou que alguém
estava querendo falar comigo. “Mas alguém quem?”, perguntei pra ele. Pai Zinho
deu um sorriso de Mona Lisa e desligou o Skype, fazendo aquele barulhinho
esquisito: birurum-bum!
No canto mais escuro do meu
escritório começou a soar uma toada de viola caipira. Que susto! Um preto velho
de barba branquinha, chapéu de palha e roupa toda rasgada tocando viola no meu
escritório! Que diabos era isso? Mas ele tocava divinamente a viola e cantava
uma canção:
Caro senhor Jeffinho
Escute aqui o meu
canto
É o cego do
Registro
Soltando seu
triste pranto!
Nossa! Era Bento Cego, nosso
grande cantor e poeta! Nascido no Registro, em Antonina, em 1821 e falecido em
Cajuru, São Paulo, em data incerta. Grande cantador que percorreu o sul e o
centro do Brasil desafiando os violeiros que encontrava em animados desafios de
trovas. E Bento Cego estava ali, em meu humilde cantinho, tocando sua viola! Que
honra! Fiquei pasmo de escutar, e ele emendou outra quadrinha:
Eu quero mandar
recado
Ao amigo boca
suja
Que andou falando
na rede
De uma tal dita
cuja
Não ligue meu
caro amigo
Com o forte
destempero
Quando mandam
calá boca
É causa de
desespero!
Fiquei ali feliz escutando o
canto triste de nosso grande e popular cantor. Que riqueza de poesia, que
versos mais inspirados! Não conseguia nem falar na presença de tão grande
poeta. Ele prosseguiu:
Pode falar nepotismo
Pode falar mãe
coruja
Mas quando for
falar mesmo
Não fale que é
ficha suja!
Ficha suja ainda não
é
Pela lei do seu
juiz
Perto do tal
Cachoeira
Qualquer um é
aprendiz!
Que poesia, que encanto! Bento Cego
tocava com destreza sua viola e sua musica enchia todo o meu pequeno
escritório. Foi tanto encantamento que nem consegui levantar dali pra chamar
minha mulher, que estava entretida com as flores do jardim, pra vir ver o Cego
cantar. Pensando bem, melhor não. Vai que ela não vê e não escuta nada e diz
que estou pirando...
Pode falar do seu
padre
E do juiz de
lambuja
Só o que não pode
mesmo
É chamar de ficha
suja
O Cego não sabe
das lei
Dos dotores
divogado
Mas pra falá “ficha
suja”
Fale com muito
cuidado!
Por fim, Bento Cego terminou seu
canto, largou as mãos da viola e deu um sorriso largo com seus dentes brancos.
Sua imagem foi esfumaçando, esfumaçando, e sumiu por entre meus livros. Fiquei
ali parado, sem saber pra onde ir, sem ter o que falar. A bela tarde de domingo
lá fora, e eu ali parado, com a melodia da viola do Cego na minha cabeça. Que
coisa!
Depois de ficar ali matutando
qual a razão de tão ilustre visita sem poder atinar por que seria, lembrei que
tinha uma calçada pra varrer. Mãos à obra! Se eu não cuidar de minha calçada
ela vai pretejar com o sumo das amorinhas. Deus me livre de ficha suja, quero
dizer, de ficar suja! E, antes que me esqueça: Viva o canto sem censura de
Bento Cego!
segunda-feira, 14 de maio de 2012
NUNCA TANTOS CAPITÃES E DOUTORES
Capa da primeira edição do livro de Thomas Bigg-Wither, "Pioneering in South Brazil", de 1878 |
PARTE 1
O rebocador chegou às três horas, mais ou menos. Era uma
embarcação pequena, de rodas, de vinte toneladas talvez, e, embora sendo curta
a distância entre Paranaguá e Antonina, não podíamos esperar fazê-la em menos
de quatro horas, considerando o fato de estarmos rebocando cinco barcaças
carregadas.
Paramos em Paranaguá um quarto de hora. Com melhor
conhecimento da cidade, eu diria que ela não podia ser muito sadia, cercada de
brejos como se acha, e não só, pois, quando a maré baixa, vêem-se grandes
extensões de lama em frente à cidade, expostas a um sol abrasador. Contudo, os
moradores não se queixam de sua insalubridade, mas nem os do Rio de Janeiro o
fazem da cidade em que vivem.
(...)
Toda a região, que se estende para o interior, por muitas
milhas até as encostas da serra do mar, parecia ser imenso pântano, com um ou
outro baixo montículo aqui e ali. Toda esta parte não era cultivada,
naturalmente, e quem a olhasse sentiria arrepios. No lado oposto da baía, o
terreno era montanhoso, cultivando-se ali o solo em pequena extensão. Estas
observações foram feitas enquanto navegávamos rumo a Antonina, rebocando as barcaças
na velocidade média de três milhas por hora. (...)
Nunca, pensei comigo, “o mais velho habitante de Antonina”
presenciou a chegada de tantos “capitães” e “doutores” (descobrimos depois que
teríamos de escolher um desses títulos, pelo fato de sermos engenheiros).
A fim de darmos ao nosso desembarque na província em que
futuramente trabalharíamos aspecto festivo, abrimos uma de nossas caixas de
fogos de artifício e foguetões de sinal, combinado de solta-los um pouco antes
da chegada do navio à vila. O sol já se havia deitado há muito tempo quando
chegamos à distância de uma milha de Antonina. A noite era escura e, portanto,
favorável ao espetáculo. A um sinal convencional, o navio ficou iluminado pela
abundancia dos foguetes, pistolões e rodinhas. No mesmo momento muitos vivas à
Inglaterra, saídos de uma vintena de estentóricos pulmões, foram ouvidos.
Quando o espetáculo ainda estava no auge, desprendemos, subitamente, o cabo do
reboque e o pequeno rebocador, livre das barcaças pesadamente carregadas, encostou
garbosamente no cais, resplandecendo ainda por cima e ao derredor pelos fogos
que soltávamos, em grande estilo. Assim, mais uma vez, triunfalmente,
desembarcamos nas costas do Brasil.
O espetáculo pirotécnico havia atraído uma pequena multidão
ao desembarcadouro, pois não há nada que o brasileiro goste mais do que soltar
uma bomba, busca-pé ou foguete, contentando-se também com ver os outros
soltarem. Com efeito, que seria dos dias santos ali, se não houvesse a feliz
invenção dos fogos?
(Thomas Bigg-Wither (1845-1890) era um engenheiro inglês; Seu relato parcialmente publicado aqui descreve sua estadia em Antonina em 1872, como parte de um grupo que estava estudando o trajeto de uma grande ferrovia entre o Mato Grosso e o Paraná, então recém emancipado de São Paulo; trata-se de uma das mais completas e bem-humoradas descrições da Deitada-a-beira-do-mar no seculo XIX)
domingo, 13 de maio de 2012
CANELADAS....
MUNIRA PELUSO PROCESSA BLOGUEIRO
"copiei do Amigos do Jequiti'
Logo de cara coloco uma declaração do Ministro Ricardo Lewandowski sobre a liberdade de expressão:
2. Ontem, por volta das 14:30 horas, recebi ordem judicial prolatada nos Autos 1843-30.2012, Comarca de Antonina, para remover postagens a ela relacionadas, uma de 17, outra de 19 e a terceira de 21 de abril, embora o mandado seja impreciso e genérico.
3. As postagens removidas, embora eu não as considere ofensivas coisa nenhuma, estarão "fora do ar", por assim dizer, e provisoriamente, porque ao final do processo provarei que não sou e nunca fui leviano e/ou mentiroso.
4. Reafirmo que a remoção relaciona-se ao cumprimento do mandado do MM Juiz de Direito da Comarca de Antonina, e não porque reconheça ou aceite que as postagens acima linkadas tenham atingido a honra da autora.
5. Permaneço e permanecerei em condições de andar por este mundo de cabeça completamente erguida e, muito especialmente, mantenho-me e manter-me-ei orgulhosamente capaz de encarar - olho no olho - meus filhos e meus netos. Eles sabem o pai e o avô que sou.
6. Lutarei o bom combate, como sempre fiz: brincaremos no regato, amanhecerá tomate, anoitecerá mamão.
7. Não me calarão! Mas nem fudendo!
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“A Constituição Federal, nos artigos 5º, incisos IV e IX, e 220, garante o direito individual e coletivo à manifestação do pensamento, à expressão e à informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, independentemente de licença e a salvo de toda restrição ou censura" .
De antemão como não posso ser contra aos direitos constitucionais do cidadão, e aida conheço a honradez e a dignidade do amigo Paulo Cequinel, a ele presto minha solidariedade e apoio contra essa tentativa nefasta de cercear a livre manifestação.
"A ditadura não suporta a luz da democracia".
Abaixo publico a postagem do amigo Paulo sobre o episódio.
1. Munira "Mônica" Peluso está a processar-me por ter a ela me referido como Ficha Suja.
2. Ontem, por volta das 14:30 horas, recebi ordem judicial prolatada nos Autos 1843-30.2012, Comarca de Antonina, para remover postagens a ela relacionadas, uma de 17, outra de 19 e a terceira de 21 de abril, embora o mandado seja impreciso e genérico.
3. As postagens removidas, embora eu não as considere ofensivas coisa nenhuma, estarão "fora do ar", por assim dizer, e provisoriamente, porque ao final do processo provarei que não sou e nunca fui leviano e/ou mentiroso.
4. Reafirmo que a remoção relaciona-se ao cumprimento do mandado do MM Juiz de Direito da Comarca de Antonina, e não porque reconheça ou aceite que as postagens acima linkadas tenham atingido a honra da autora.
5. Permaneço e permanecerei em condições de andar por este mundo de cabeça completamente erguida e, muito especialmente, mantenho-me e manter-me-ei orgulhosamente capaz de encarar - olho no olho - meus filhos e meus netos. Eles sabem o pai e o avô que sou.
6. Lutarei o bom combate, como sempre fiz: brincaremos no regato, amanhecerá tomate, anoitecerá mamão.
7. Não me calarão! Mas nem fudendo!
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Em solidariedade ao amigo Paulo Cequinel que está sofrendo um processo da senhora Munira, a partir de agora este blog vai ficar “as moscas”.
Quem quiser se manifestar só precisará utilizar seu email e prestar seus comentários, sem moderação prévia do editor.
Essa medida coincide com a opinião de alguns comentaristas que propuseram a eliminação dos comentários anônimos, com o intuito de qualificar ainda mais este espaço, e também pelo email que recebi, no qual propõe a mesma medida e mais, que muita gente acessa e respeita o blog, mas não comenta por medo de ataques desrespeitosos dos anônimos (sic).
Portanto, meus caros, espero a compreensão de todos.
"Há pessoas que peferem a escuridão dos porões da ditatura a luz da democracia".
NE URUBLUES - Coloco-me totalmente solidário aos companheiros bloguistas, nessa tentativa de mordaça judicial imposta por políticos desesperados.
sábado, 12 de maio de 2012
QUE COMECE COM 'R"
Meu avô, Manoel Picanço (1904-1967) escrevia um diário, onde contava causos e anotava fatos do cotidiano de Antonina. Se tivesse conhecido a internet, "seu" Maneco com certeza seria blogueiro... |
No dia 3 de maio
de 1949, assisti na farmácia do Sr. Romildo Gonçalves Pereira, um caso
interessante. Estava eu na farmácia acima quando chegou um caboclo e disse ao
empregado do Sr. Romildo:
-
O Senhor me venda uma pílula que comece com R...
O funcionário deu
uma risadinha e foi buscar a pílula.
Em julgando
tratar-se de uma piada do caboclo, por tratar-se da farmácia do Romildo, cujo
nome começa com R, me aproximei do mesmo e interroguei:
- qual o motivo
do Senhor solicitar uma pílula que comece com R?
- É que a doença
começa com R, é Reumatismo, respondeu o caboclo.
E o empregado lhe
trouxe CafiAspirina. A conclusão foi que, Romildo Com R, Reumatismo com R e
pílula com R, daria tudo certo. Mas o pobre levou CafiAspirina - na certa de que
era com R.
sexta-feira, 11 de maio de 2012
quarta-feira, 9 de maio de 2012
EM DEFESA DE EDUARDO BÓ
Vivemos tempos extraordinários. A internet e as novas
tecnologias da informação nos tornam mais conectados, numa proporção, desculpem
a frase, nunca antes vista na história da humanidade. No entanto, importantes teóricos
da rede são unânimes em apontar, em paralelo com os benefícios dessa interconectividade
toda, a presença de alguns problemas graves. Um deles, que gostaria de comentar aqui, diz
respeito ao anonimato.
O anonimato está presentes na blogosfera capelista em grau
muito intenso e importante. Um deles diz respeito às carradas de comentários anônimos
que pululam na nossa comunidade. Em certo ponto, pode ser até bem vindo. É muito
ruim quando isso toma o comportamento de turba. No entanto, o que não se pode mesmo
tolerar é a brincadeira passar do ponto e descambar para a injúria, a
difamação e a calúnia.
Vi, desde a semana passada, diversos comentários postados
anonimamente em vários blogs importantes e respeitáveis da cidade questionando
a prestação de contas do livro “Antonina – 35 anos de cumplicidade”, de nosso
querido Eduardo Bó. Antes de tudo, quero dizer não tenho procuração para
defendê-lo, embora me considere seu amigo. Nesta tarefa não estou sozinho, pois
vários bloguistas já se manifestaram a respeito do assunto de maneira bastante
contundente. Se também o faço, é porque vejo nessa atitude covarde de alguns
uma tentativa de atingi-lo no que uma pessoa tem de mais sagrado, que é sua
honra.
Eduardo Bó pode ter
todos os defeitos do mundo, mas é uma pessoa honrada. Poucas pessoas vivas
fizeram tanto pela sua, pela nossa Antonina, mais do que ele. Seu trabalho como
fotografo, bloguista e com idealizador do Festival de Inverno falam por si. Poucos
bagrinhos são referência como Eduardo Bó. Prefeitos, vereadores, políticos,
fofoqueiros de esquina passam. A obra de Eduardo, como representação do que é a
Deitada-a-beira-do-mar nos últimos 40 anos, o seu incansável trabalho de
documentarista de nossa cidade e de seus habitantes permanece. Essa é a importância de sua obra toda, a que vem se somar mais esse livro.
Um livro que não foi produto de um conchavo de bastidores,
de negociata, mais foi sendo amorosamente gerado ano após ano, na avenida do
samba, retratando o que ele, Eduardo, mais gosta de retratar – a gente de Antonina. Um livro
esse que foi financiado por uma lei de fomento, qual o problema? Ao contrário
dos artistas nacionalmente consagrados que alguns protestaram recentemente,
Eduardo teve que ralar atrás de empresários o patrocínio a que tinha direito,
um patrocínio, aliás, oriundo de renúncia fiscal do governo. Não é fácil para
um artista, e ainda um artista bagrinho, vencer as resistências de empresa após
empresa, até conseguir o total para financiar o livro. Eduardo lutou e
conseguiu. Qual o problema com isso?
Eduardo Bó não é um homem rico. Tem suas posses, cuida de
sua vida, paga seus impostos. Esse livro não vai fazê-lo mais rico. Sua riqueza
vem de sua arte, do seu talento, uma coisa tão desproporcionalmente repartida
que faz da pessoa talentosa um devedor nato. Sim, quem tem talento tem o dever
de reparti-lo com todos os demais. E isso Eduardo vem fazendo com sua arte em
doses generosas já lá se vai quase um vida inteira.
Qual seria o desígnio destas pessoas, acoitadas no mais vil
anonimato, desmerecer, lançar duvidas ou tentar jogar lama no sucesso alheio? Meu
amigo, vá trabalhar, vá fazer algo de útil para si, sua família ou sua cidade. É
preciso acabar com essa autofagia perniciosa, que nos enterra politica e
economicamente há quase meio século. É preciso circunscrever esses covardes no
seu sujo covil, no antro de suas perversidades, ou eles tomam conta de tudo. Tomam
conta da blogosfera, tomam conta da cidade e, pior, tomam conta de nossa alma,
de nosso espírito. Como construir a cidade que todos queremos com o espírito roído
por essa inveja mesquinha e imunda, por essa autofagia porca e rasteira?
Não foi pra isso que Valle Porto fundou essa cidade.
domingo, 6 de maio de 2012
ANTONINA ANTIGA - VIII
Uma bela foto, mostrando a Praça Rio Branco, a atual Praça Romildo
Gonçalves Pereira, lá pelos anos 20 do seculo passado. Segundo Ermelino de Leão, essa área era conhecida como “cais”,
ou “aterrado”. Foi nessa área, próximo da antiga rua da praia, a atual Marquês do
Herval, que deve ter-se iniciado o aterro da praça. Devia ser uma área de
praia, isto é, com alguma areia; as ondas viriam bater ali nas pedras onde estão
atualmente várias casas antigas e o restaurante Baía Bonita. A praia terminava
na ponta da Califórnia, acidente geográfico desaparecido com a construção do armazém
do Macedo, que hoje é o casarão em ruinas no fim da rua.
Quase todos os terrenos do lado do mar na rua Direita, a
atual XV, chegavam até o mar. Não é de se espantar que fosse aí que se
localizaram diversas empresas de exportação e importação, as quais construíram diversos
trapiches que se podem ver em outras fotos. A atual praça deve ser do inicio do
século XX, pois é citada por Ermelino em sua obra “Antonina Factos e Homens”, de 1918. O que se exportava então: nessa época,
principalmente erva mate. Importava-se quase tudo.
A foto mostra as diversas casas ao redor da praça. Algumas bem
grandes, como o casarão onde atualmente é a Associação dos Funcionários
Públicos. Trata-se de um prédio grande, que rivaliza com os grandes casarões da
rua Direita que podem ser vistos ao fundo da foto. Outra casa grande fica à esquerda na foto, onde se pode ler que a casa é a sede da firma Guimaraes e Cia.
As restantes são casas pequenas, com duas ou três aguas. Das demais casas, somente
uma apresenta platibanda, situada na parte esquerda da foto, com uma decoração
de jarros.
Além das casas, a natureza toma conta do resto: as três árvores
na frente, as duas belíssimas palmeiras imperiais na parte esquerda e os morros
do outro lado da baia compõe o cenário. Note-se que a praça é coberta de mato,
e muito mato. Devia ser usada para os cavalos e burros do transporte de carga
pastarem. Na rua, pode se ver aqui e ali algumas pessoas andando de paletó e chapéu
e outras em manga de camisa trabalhando, provavelmente carregando alguma carga
ou mercadoria.
Eu conheci essa praça com o nome de Feira-mar, pois o
prefeito da época, em 1969, Romildo Gonçalves Pereira, colocou saibro e fez uma
grande exposição feira de diversos produtos, a tal Feira-mar. Depois dele, nos
tempos de Joubert Gonzaga Vieira, a praça virou praça e tomou o seu atual nome.
Durante algum tempo, a praça da Feira-mar foi lugar dos namorados anônimos. “Foram pra Feira-mar!”
e péquete! A guria ficava mal falada. Ser vista na Feira-mar de noite era uma temeridade. No entanto, era também uma possibilidade remota, dada a precariedade da iluminação de então.
Hoje, ela é a praça onde o pessoal vai tomar cerveja no fim
de tarde, onde bate um vento bom vindo do mar. Nas festas, o pessoal deita ali
de manhã e curte suas ressacas enquanto o sol não fica alto. E, também onde a
turma do litro bate ponto, faça chuva ou faça sol, pra desespero das pessoas sérias.
Bobagem. A turma do litro, na verdade, é a versão Cracolândia dos bagrinhos – você
desmancha ela aqui, ela surge ali adiante, quase como se fosse possível apanhar
o ar com as mãos. Quem já viu a cracolândia de São Paulo ou de outras grandes
cidades sabe do que estou falando. Nem sei qual seria o problema ou a solução,
mas repressão pura e simples realmente não funciona.
Enquanto isso, o velho Aterrado segue cheio de histórias pra
contar.
sexta-feira, 4 de maio de 2012
A NOVA ANTONINA
o Farol da Ilha do Mel em 2062, submerso por causa do aquecimento global |
Estamos no ano de 2062. Com o aquecimento global, o nível dos oceanos subiu
três metros em todo o planeta. Com isso, amplos trechos da cidade ficaram
submersos. Sobrou a colina da matriz, transformada de novo em ilhazinha batida
pelas ondas, e o morro do Bom Brinquedo, que virou ilha do Bom Brinquedo. Os
bairros ficam isolados, as pessoas não têm como se mover, não há barcos pra
todos. O caos se instala. Não há alternativa, pensam os habitantes, a cidade
vai ter que se mudar. Pra onde?
Existe um lugar, apontam os técnicos do governo do estado, é
a região de São Joãozinho Feliz. Lá deve se localizar a Nova Antonina, distante
da velha Antonina tão cheia de pecados e agora tragada pelas aguas do
aquecimento global, como foi previsto pelos profetas do inicio do século XXI. É
uma nova oportunidade de zerar tudo e começar de novo, sem os erros do passado.
Ótimo, diz a prefeita
da época, vamos desapropriar essa área e vamos construir a nova cidade. Todos
ficam felizes com sua determinação. O Governador vai até lá de helicóptero,
abraça e beija as criancinhas e diz que vai mandar dinheiro. O Ministro também
prometeu liberar as burras da administração federal pra salvar a cidade submersa.
Mas, há empecilhos: alguns proprietários querem se livrar
logo de suas terras, outros elevam o preço até as alturas. O dinheiro não
chega, não chega, e, quando chega, é um terço do dinheiro inicialmente
previsto. Há que se fazer licitações para construção das ruas e das casas. As
licitações são lentas, pois desde o inicio do século pioraram muito as leis de
licitação para evitar a corrupção politica. Somente empresas marcianas de
ilibada reputação se candidatam.
Onde vão ser as casas? Quem vai ter acesso a elas? Nesse momento, a elite da cidade, que ninguém
achava que existia, toma a frente e requer os melhores lugares. Depois, a
classe média e, por fim, o povão ocupa o que sobrou, ou seja, alto de morro,
beira de rio, locais de mangue. O terreno todo é ocupado, alguns proprietários
são indenizados, de preferencia os amigos da prefeita ou do deputado amigo da
prefeita. Os outros que se virem. A oposição reclama, os blogs reclamam, mas a
caravana passa. A nova Antonina inicia as obras de sua refundação.
Quando os operários executam a primeira sondagem, um cheiro ruim
invade a área. Mulheres desmaiam, crianças choram, e um cheiro de ovo podre
toma conta do ar. Um velhinho bem velhinho se lembra de que era ali, naquele
lugar, que no século XX e começo do XXI onde os capelistas jogavam seu lixo. O
terreno mole começa a afundar, engolindo a super-escavadeira recém-comprada
pela prefeitura, tragada pelo solo colapsível do lixão, ops! Aterro Sanitário.
Em meio ao caos que se forma, alguém pergunta pra prefeita o
que fazer. Atarantada, como todos por ali, a alcaidessa olha em redor e grita:
“vamos pra Morretes! Eu já moro lá e é
pra lá que nós vamos!” A multidão começa a pegar suas tralhas e uma longa
peregrinação começa pela estrada do Sapitanduva em direção à terra de Rocha
Pombo. Os anônimos dos blogs não vão ter mais do que reclamar, pois alcançamos
finalmente Morretes, a perfeição na Terra. Lá não jorra leite e mel, mas é mais
limpinha, organizada e tem emprego nos restaurantes. Que não haja medo do
futuro nem saudade do passado: ao virar a última curva, onde ainda se avistam
as ruínas de uma antiga cidade deitada embaixo do mar, que ninguém olhe para
trás, por via das dúvidas.
quarta-feira, 2 de maio de 2012
UMA PAISAGEM SUIÇA
Karl Von Koseritz, jornalista teuto-gaúcho, foi um importante jornalista do periodo imperial; essa é a primeira visita que nos fez, em abril de 1883.
Karl Von Koseritz (1830-1890) |
Cerca de 10 horas e surgiu à vista a pequena cidade de Antonina.
Como num cenário levantavam-se dos dois lados, principalmente do direito, as
cadeias de montanhas e a vista é das mais imponentes que já conheci,
absolutamente uma paisagem suíça. Assim como a estrada do Paraná é
absolutamente uma estrada suíça. Eram 10 horas e nós estávamos justamente
sentados para almoçar, quando a ancora caiu no belo porto de Antonina que é
livre de qualquer obstáculo.
Se eu não soubesse que o Brasil é incompreensível
eu acharia estranho que a estrada não tivesse partido de Antonina, em vez de Paranaguá,
para Morretes e etc. em todo caso Antonina é a localidade de maior futuro e só
a falta de estrada de ferro poderá deixá-la para trás. A competição que existe
entre Antonina e Paranaguá é semelhante à que existe entre Pelotas e Rio
Grande. Para Paranaguá – como para Rio Grande – foi levada uma absurda estrada
de ferro, e Antonina se queixa,- como Pelotas, - do fato de não possuir uma
alfândega. Sempre há aqui uma diferença: Pelotas ganhou aos senhores de Rio
Grande uma mesa de rendas alfandegada. Desci em Antonina com o amigo Rosch, que
tinha um conhecimento da terra igual ao que já demonstrara sobre a estrada do Paraná.
Antonina tem um bonito cais e é uma gentil cidadezinha, não completamente
limpa, mas, em todo caso, mais limpa do que Porto Alegre. O pior estado
sanitário é devido à extraordinária extensão das marés; a maré baixa deixa
muitas quadras cobertas de lama. Sobre a qual queima um forte sol; está claro
que aí não deverão faltar os miasmas.
Coisa inesperada para mim foi a
existência de ruínas quase românticas, velhos panos de muro cobertos pela
vegetação, que devem restar do tempo das primeiras habitações. Grandes
quantidades de urubus pousavam sobre quase todos os tetos ou passeavam nas
ruas, como, entre nós, as pombas. Logo chegamos à hospedaria da velha Rosskamm,
aquela casa que todos os alemães do Paraná conhecem. Lá nos deliciamos com a
excelente cerveja nacional de Morretes, que o amigo Rosch pretende ser o único
preservativo contra a febre palustre, e estivemos em animada conversação com os
outros passageiros desembarcados.
Eu esperava atravessar Antonina incógnito,
mas não pôde ser, porque apenas a velha Sra. Rosskamm ouviu o meu nome na nossa
conversa, dirigiu-se a mim perguntando: “o
senhor é o Koseritz, cujo calendário e cujo jornal possuo?”. O incógnito
tinha ido por água abaixo e não seria utilizado mais tarde,pois pouco depois,
quando passeávamos pela calçada irregular, entre ruínas e urubus, aproximou-se
um dos sólidos carros que viajavam até Curitiba e desde longe, de dentro dele,
o coronel Schuster-Schutz lançou-me um cordial “seja bem-vindo”. Voltamos com ele à casa da Sra. Rosskamm e passei
uma hora com o velho e caro amigo, que se tinha curado de uma febre de 13 meses,
contraída na colocação de telégrafos no Paraná. Schuster-Schutz envelheceu, mas
conserva fiel sua raça de outros tempos e é sem duvida um homem que prestou ao Brasil
os maiores serviços. Ele colocou quase toda a rede telegráfica do império.
Pelas 4 horas nos despedimos da sra. Rosskamm e regressamos para bordo.
Na
volta pela praia vimos uma coisa extraordinária: quatro gigantescas rodas que
um talentoso engenheiro fez construir há tempos para, com seu auxílio,
conseguir transporte através da serra! Lá estão elas, apoiadas numa ruína,
antigo e triste testemunho da insensatez dos homens, que a tornou inúteis e
vencidas. As rodas gigantes são sem duvida a coisa mais notável de Antonina.
Quando chegamos a bordo o exército vitorioso já tinha embarcado, com exceção do
comandante e seu estado maior. Mas lá vêm eles, numa barca militar
embandeirada, com enormes bouquets de flores nas direitas possantes, e com
flores em todas as casas de botões. Como se vê, Antonina honrou os “bravos
vencedores” de Curitiba. Assim que o leal Eneias chegou a bordo com seu estado
maior, largamos e breve estávamos de novo diante de Paranaguá, onde recebi a
comunicação telegráfica de que o ministro Ávila nos aguardava desde o dia anterior
em Santos. Chegou-nos, por cima, a bordo, ainda uma companhia de artistas
cavaleiros, com seus cavalos magros e não menos magras raparigas e, ao cair da
tarde, passamos, repletos, pela barra de Paranaguá, diante da alta ilha e do
belo farol, com a agradável certeza de termos a bordo pelo menos 600 passageiros.
Bordo do “Rio de Janeiro”, 16 de abril de 1883.