sábado, 28 de abril de 2012

MUNIRA E AS QUESTÕES AMBIENTAIS


 (esta é uma cronica que escrevi em 1997, mas que, por motivos diversos, nunca foi publicada; coloco-a em questão tendo em vista algumas discussões que temos travado na blogosfera capelista; as palavras em negrito e entre colchetes são observações atuais)

O jornal Voz do Litoral, em seu número 10, de junho deste ano [1997], publicou em sua página 2, na seção "Opinião", um artigo intitulado "Antonina e seus problemas ambientais",  que apresenta na íntegra o discurso que fez a Prefeita Monica Peluso no Seminário "A gestão integrada dos recursos naturais do complexo estuarino-lagunar de Iguape/Paranaguá",  realizado em Ilha Comprida (SP), durante a Semana do Meio Ambiente.

Em seu discurso, a Prefeita apresenta Antonina, sua situação geográfica e seus problemas ambientais, salientando os projetos que pretende implantar e as ações levadas a efeito pelo Governo do Estado e por diversas ONGs no município. Ressalta que Antonina é uma cidade "em vias de retomar o impulso em suas atividades portuárias, depois de um hiato resultante do ostracismo a que foi levada pelas autoridades, em todos os níveis , do passado".

A Prefeita enumera em seu discurso alguns problemas ambientais da cidade, como o extrativismo predatório, ocupação de encostas e de manguezais, falta de rede de esgotos e de disposição adequada do lixo urbano. No entanto, gasta a maior parte do tempo num " problema ambiental singular", segundo suas próprias palavras, "que é o da progressiva dessalinizaçào de suas águas no fundo da baía, pois recebe a contribuição de diversos rios". Ressalta ainda que este problema afeta diretamente a fauna marinha da baía de Antonina, "afastando as espécies de água salgada das áreas diretamente atingidas pela água doce".

Ao se referir à dessalinização das águas, cremos que a Prefeita se refere ao fato de que, em ambientes estuarinos, como é o caso da baía de Antonina, existe uma complexa inter-relação entre a água doce proveniente dos rios e a água salgada, proveniente das marés. Este é um fenômeno natural em qualquer estuário em qualquer região do planeta e, longe de ser negativo, representa o ambiente por excelência para a instalação de manguezais. As formações de mangue ocorrem preferencialmente nesta interface entre a água salobra e a doce, e são o local de procriação preferido por diversas espécies marinhas. Basta observar como nunca encontramos formações de mangue em contato direto com o mar aberto, porém abrigados por trás de lagunas ou baías. Não é por acaso que as formações de mangue, assim como toda a área de contorno da baía de Antonina, foram declaradas de interesse e proteção especial pelo Decreto Estadual no 2963, de 19/12/1980, artigo 1o, alíneas IV e V, em complementação à Lei Federal no 6766, de 19/12/1979.


A importância de nossa baía, portanto, reside no fato de que ela é o santuário por excelência das formações de mangue, visto apresentar contribuição tanto da água dos rios como das marés. Não devemos censurar a ignorância da Prefeita em assuntos de meio ambiente, uma vez que formação escolar não é pré-requisito para cargos públicos. No entanto, parece claro que nesta área está mal assessorada, e aí é que está o problema. Na Antonina que está a um passo do desenvolvimento, uma política de meio ambiente pouco fundamentada ou supérflua pode agravar ainda mais os problemas ambientais já tão críticos.
  
Evidentemente, os problemas ambientais de Antonina não estão na maior ou menor quantidade de sal na baía, mas em séculos de exploração não sustentada de seus recursos naturais. O assoreamento da baía, causado pelo desmatamento das encostas da serra do mar,  vaticinado pelo professor Bigarella ainda nos anos 70, intensifica-se e chega até o presente como uma tragédia anunciada. Nossos esgotos domésticos poluem a baía, diminuindo sensivelmente a fauna marinha em quantidade e qualidade. A ocupação de encostas sem o devido cuidado, assim como o aterro dos manguezais, prossegue sem um Plano Diretor para a área urbana, com as bênçãos da Especulação Imobiliária. A miséria e a incultura espalham a degradação ambiental, fonte de doenças e de desajuste social.

Outro de nossos males é a memória. A memória antoninense é por tradição fraca e vaga. Documentos históricos, em vez de serem analisados por historiadores, apodrecem em casas de família, ou são surrupiados das repartições públicas. O que fica é o predomínio da versão sobre o fato, da lenda sobre a história. Em que bases a prefeita afirma que a população de Antonina remontava a mais de 30 mil habitantes em 1930? Para conter uma população deste porte, a área urbana deveria ser muito maior naquela época do que hoje, quando a cidade comporta cerca de 18 mil. A maior perda de população em Antonina verificou-se a partir do fechamento do porto, na década de 70. No censo de 1970 a população era de 17 mil habitantes, continuando praticamente igual quase trinta anos depois. Estes são dados do Censo. Em quais dados a prefeita se baseia para suas afirmações? 

A Prefeita comemora em seu discurso a existência em Antonina de grandes Parques Estaduais, Reservas e Áreas de Preservação. É necessário que a administração municipal não tome como seus méritos de governos estaduais e ONGs. E é urgente que se discutam formas de envolvimento da população com estes projetos, geralmente alienígenas. Atividades preservacionistas em nosso país devem ocorrer no contexto de um desenvolvimento ambientalmente sustentado, que traga benefícios reais à população, e não meramente garanta a manutenção de algumas ONGs.

São bastante louváveis os esforços ambientais da Prefeita, como os projetos Pró-Atlântica, Baía Limpa, Lixo Bom e outros, ainda mais sucedendo a um prefeito que, como se sabe, nunca morreu de amores pelas questões ambientais. No entanto, a implementação de projetos ambientais com um suporte técnico como o revelado pelo discurso da Prefeita é preocupante, uma vez que podem ser  - como tantos outros administradores que falam de meio ambiente - atos vazios e de mera propaganda,  sem representar um impulso para ações ambientais mais corajosas e criativas.

Enfrentar com coragem e criatividade a questão ambiental é um dos desafios das administrações do presente, em qualquer esfera. O Efeito estufa, o rompimento da camada de ozônio, a desertificação que avança sobre áreas agrícolas em todas as partes do mundo, a poluição dos recursos hídricos, são alguns problemas a serem enfrentados em escala global. Em nosso país, somam-se ainda as questões sociais ainda não resolvidas, impondo o desafio de um desenvolvimento econômico ambientalmente sustentado. Para tanto, além de coragem política, é necessário o conhecimento técnico adequado destes problemas.

No caso antoninense, é necessário ainda superar as "questões de aldeia" e enfrentar os problemas com propriedade. Não podemos mais ser amadores ou empurrar os problemas com a barriga, aguardando, com paciência municipal, miraculosas soluções estaduais ou federais. Ou estaremos comprometendo o melhor de nosso futuro. Precisamos cuidar de nossa baía, a qual, como muito acertadamente já dizia a canção, foi um presente do mar. 

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