segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

A MARCHA DOS ESCOTEIROS 32: ENTRE GAIJINS E NIHONJINS


Cartaz Japonês incentivando a imigração para o Brasil

(Estamos no mês de janeiro de 1942. Enquanto o mundo está em Guerra e o Brasil segue sob a Ditadura do Estado Novo, cinco escoteiros de Antonina (PR), entre 15 e 18 anos, estão desde 16 de dezembro de 1941 numa marcha a pé rumo ao Rio de Janeiro para entregar uma mensagem para Getúlio Vargas. No episódio de hoje, 13 de janeiro de 1942, Beto, Milton, Lydio, Antônio (Canário) e Manoel (Manduca) estão saindo de São Paulo e chegando em Suzano.)

Mal começou a raiar o dia, cinco escoteiros de Antonina já estavam no seu caminho. Tinham que chegar ao Rio, para cumprir sua missão. Nesta terça feira, 13 de janeiro de 1942, os jornais paulistanos anunciavam a IIIª Conferência doa Chanceleres Americanos, que ia começar no Rio de Janeiro. Esta conferencia era uma resposta ao ataque japonês a Pearl Harbour, fazia pouco menos de um mês, e que havia forçado a entrada dos Estados Unidos diretamente na Guerra. Os chanceleres de todos os países americanos iam decidir o que fazer ante a ameaça nipônica.

Entre as notícias que davam conta dos combates na Ásia, uma pequena nota no “Correio Paulistano” falava do raid dos escoteiros. Nela, Chefe Beto falava sobre as impressões dos rapazes sobre o estado de São Paulo. Na entrevista, ele fala da boa impressão que lhes deu a agricultura em São Paulo. Disse que sempre havia com que se abastecer por todo o caminho. Quando a distância era muita, “recorríamos à natureza: na caça e na pesca buscávamos nossa subsistência”, completou ele. 

E agradeceu a generosidade com que foram recebidos em todas as cidades percorridas. “Prova do espírito de patriótico cooperativismo que anima todos os brasileiros, integrados na cruzada comum de honrar e engrandecer a Pátria”. 

Enquanto as grandiloquentes palavras de Chefe Beto eram lidas nos Jornais, os rapazes, Milton, Lydio, Canário e Manduca, estavam passando por perrengues mais ou menos normais da ventura: o tráfego rodoviário na estrada de Poá estava muito intenso. Curvas estreitas, curvas muito fechadas sem parapeitos, e eles viam quase desastres, que não se consumavam por milagre. Mas as casas ao redor eram muito boas, segundo anota Lydio. 

As 11 horas eles passaram por Suzano. Era uma pequena cidade ainda em formação. O que impressionou Lydio era a grande quantidade de Japoneses. Ali conviviam os nihonjin, como os japoneses se chamavam, com os gaijin, ou os brasileiros. Gaijin é uma forma pejorativa de chamar, e a tradução correta é "bárbaro estrangeiro". Os nossos bravos gaijins antoninenses haviam andado cerca de 10 quilômetros aquele dia. Daria pra andar mais, muito mais. No entanto, o tempo fechou. 

Um forte aguaceiro caiu sobre a pequena cidade, o que levou os escoteiros a se abrigarem por ali. Já era 16 horas, a chuva não abrandava. Procuraram o prefeito, que se desculpou por não os atender melhor, pois havia um só hotel na cidade e ele estava lotado. Ficaram pela rua mesmo, só se protegendo em algum lugar. 

Chamou muita atenção dos rapazes o fato da cidade ser bilíngue, com cartazes e propagandas em português e japonês. Havia somente uma Igreja católica e diversas Igrejas budistas. Até o crime falava japonês. Pelo que eles ouviram, em Suzano, havia duas gangues Japonesas, que disputavam o controle da cidade. 

No entanto, a comunidade nipônica em Suzano e no Brasil iria passar por tempo difíceis. Desde 1938, com o golpe do Estado Novo, a ditadura varguista iniciou uma forte repressão à cultura japonesa. Proibiu as aulas em japonês e chegaram a confiscar bens de imigrantes. 

Com a declaração formal de guerra aos países do Eixo, poucos meses depois da passagem dos escoteiros por ali, a repressão iria ser mais dura. Os nipo-brasileiros ficaram proibidos de viajar e mesmo de morar em determinadas áreas, como no Litoral. Com isso, muitas das famílias nipo-brasileiras que haviam recebido tão bem os escoteiros em dezembro, em Antonina, teriam que desocupar aquelas áreas que habitavam. 

Ali em Suzano, a vida seguia, apesar das agruras dos tempos de guerra. E chovia, chovia muito. De qualquer modo, apesar da chuva, os rapazes foram no cinema. O filme que eles viram, “O crime no terraço”, era o mesmo que estava passando em vários cinemas da capital. Os rapazes gostaram muito, pois havia bastante tempo que não viam um bom filme no cinema.

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