Hoje é, segundo a tradição, o dia dos mortos. Depois
de uma semana muito quente, com temperaturas chegando a 37º C, o dia por aqui amanheceu nublado
e com certa garoa. O típico dia de Finados. Se aqui está assim, imagino a bela
Deitada-a-beira-do-mar, com sua bruma matinal e sua garoa insistente.
Faz muito tempo que larguei fora as tradições, assim como
boa parte dos ensinamentos que tive, meio a contragosto, ali no alto da colina
de N.S. do Pilar. Mas hoje, talvez pela tradição, talvez pelo tempo ameno e chuvoso,
me pus a pensar nos meus mortos queridos. Meu pai, meus avós, meu tio Milton e
minha tia Vilma. Meu amigo Eder, falecido prematuramente um ano antes de sua
formatura, aos 22 anos. O bom e generoso Moacir Santos, mestre Muassa, um dos maiores geólogos que já conheci.
Dona Laura, a alegre e doce dona Laura, a rir e achar tudo “ótimo”. Quanta gente
querida brota dos pensamentos...
Percebo no ar certa vacuidade, um vazio, uma certa
melancolia, a lembrar meus entes queridos. Saudades, esse é o sentimento que vem com a tal
palavra que só se diz em português, em bom português.
Sinto muitas saudades de meu pai. Lembro que ele, apesar de
ter sido um notório xodó de igreja velha, tendo estado a frente da reforma das
igrejas de São Benedito e principalmente do Bom Jesus do Saivá, não era lá um
homem de muitos ritos. Poucas vezes foi à igreja, quase sempre em celebrações
de sétimo dia. Dizia-nos, por outro lado, ser adepto “do lado espiritual da
coisa”, ou seja, do espiritismo, esse nosso espiritismo católico-cardecista tão
espalhado por aí. Eu nunca conversei a sério com ele sobre isso, embora
respeitasse sua crença.
Não acho que existam espíritos ou coisas do gênero. Nossa vida
é uma luta contra o nada, contra o vazio. Ou preenchemos esse vazio ou o vazio
nos preenche e nos inunda. O vazio é a banalidade da vida, essa
vida que vai se escorrendo como um rio rumo ao mar, sem mais sentido que
energias cinéticas e potenciais que vão se perdendo ou ganhando na trajetória. Nem
mesmo a matéria existe, o que existe é uma profusão de partículas elementares circulando
no vazio. Mésons, píons, múons, bósons, e mais nada.
Por que recordar os mortos? Não sei exatamente. O que sei é
que a lembrança deles me toca e começo a ficar comovido feito as castanheiras
da Amazônia, que choram quando são queimadas. A lembrança de todos é a saudade
de um tempo que não volta mais, de um eu que não volta mais. Estou aqui
lembrando de coisas e histórias que são minhas, só minhas, de minhas relações com
meus mortos queridos.
Sinto-me um tanto ridículo, mas vou até a janela e acendo
uma vela. E fico um tempão olhando ela queimar. Lá fora, as arvores e
passarinhos nem estão aí pro meu chororô. Tambem não ligo pra eles, e sigo perdendo -perdendo? - um
bom tempo pensando em como é parecido – a vela queimando - e a vida, toda ela inútil, que se esvai.
Gusano, meu amigo,
onde você se enfiou?
Jeff. Sempre Alerta/Fortunato.
ResponderExcluirEm socorro do seu Dodô, repasso-lhe um endereço para ser lido.
http://filosofiaespiritismo.blogspot.com.br/2011/03/carta-ao-materialismo.html
não posso nem devo responder por seu Dodô, mas agradeço muito a gentileza, caro Natinho!! Abraços e Sempre alerta!!
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